As pessoas falam tanto em RPG narrativo, em narrativismo, mas muita gente não sabe definir de fato o que é isso. Eu me incluo neste grupo, pois somente nos últimos dias eu consegui finalmente entender boa parte a teoria do Big Model/GNS do Ron Edwards. A escrita dele meio acadêmica atrapalha o entendimento das idéias dele, mas em alguns outros blogs a teoria é descrita de um jeito bem mais claro, o que me fez finalmente entender o que é esse tal de “narrativismo”.
O Que É História
Muita da confusão que surge quando se fala de “RPG Narrativo” (seja lá o que isso significa) é que ele é focado em criar uma história. Bem, isso não é verdade. Quando você está jogando RPG, não importa como, o grupo está fazendo uma série de coisas, enfrentando certos desafios e tomando decisões. Depois do jogo, quando você olha para o que aconteceu e escreve as coisas em um sentido lógico, talvez em um report de sessão, você vai ter uma história. Pode não ser muito boa, pode ser superficial, pode nem chegar perto do que o J. R. R. Tolkien escreveu, mas é uma história, e não importa o estilo de jogo, ela irá surgir no final.
O Que É Narrativismo
Ok, agora vamos para a explicação. Narrativismo é um estilo de roleplay em que o objetivo principal do jogo é ter os personagens jogadores fazerem escolhas e ações livremente baseados em problemas humanos.
Essa é a explicação. Todo o resto é uma confusão entre técnicas de jogo – que não tem a ver necessariamente com a agenda criativa.
Note que na explicação tem dois pontos principais. A primeira e mais importante é que o jogo se baseia em liberdade de ação. Você não pode pré-definir escolhas nem decisões. Você não pode jogar tendo uma história ou plot pré definido do que vai acontecer dentro do jogo. Se você está jogando com railroad ou ilusionismo, sua agenda criativa não é narrativista. Note que isso também não significa “planejar múltiplos caminhos e deixar os jogadores escolherem” – você não pode planejar os caminhos! E como você não pode planejar ou assumir a ação dos jogadores, isso requer muita flexibilidade e improvisação do mestre durante o jogo.
Você pode ter uma situação inicial pré-definida no jogo, algo como “iremos jogar com aventureiros mercenários em um mundo de fantasia medieval de baixa magia”, mas isso não é planejar a história, isso é o planejamento da situação. Uma grande diversão em vários RPGs narrativos é justamente que esse planejamento da situação inicial do jogo é feito em grupo, não somente pelo GM – mas ele pode planejar isso sozinho e mesmo assim ter uma experiência narrativista (sejá lá o que isso signifique de fato).
A outra parte da explicação, sobre os problemas humanos, muda o foco de jogo tradicional do RPG. Utilizado um exemplo de uma aventura de combate/masmorra, esta aventura com agenda narrativista seria focada em: O que eu consigo sacrificar para salvar meu irmão que foi sequestrado pelos goblins? Quem é mais importante, a vida dos meus companheiros ou da minha cidade? Até onde eu irei para provar para o povo da cidade para provar que eu sou digno? Repare que este tipo de decisão pode estar presente em jogos tradicionais, mas neste caso ele será secundário, uma consequência do jogo, e não o foco principal.
O Que Narrativismo Não É
Narrativismo não significa jogar com um sistema com poucas regras. Burning Wheel e The Riddle of Steel são narrativistas mas são bastante complexos, mais do que alguns sistemas de simulacionismo, por exemplo.
Narrativismo não significa ter um sistema em que sentimentos e relacionamentos estão escritos na ficha do personagem. Isso não é necessário, além de que isso não significa que o foco deste jogo vai ser em problemas humanos.
Narrativismo não significa planejar um tema ou a moral da história antes do jogo. Você não planejar nada anteriormente, as coisas devem emergir durante o jogo.
Grande PedroDiscordo um pouco desse ponto de vista sobre Narrativismo. No meu ponto de vista, um RPG que distribui o poder de criar a história entre todos jogadores, tirando o peso e o fardo disto do mestre, já pode ser considerado Narrativista. Acho até que o termo Narrativista pende para o conceito de “Eu Narrador”.Explico.: Em RPGs tradicionais o jogador pergunta “Mestre, tem uma taverna nesta cidade? Sim? Ok então nós vamos lá ver se conseguimos informações”. Em um RPG Narrativo o jogador afirma: “Nesta cidade tem uma Taverna, onde meu irmão Gloin esteve. Ele costumava falar que nela haviam bardos e talvez possamos encontrar alguma informação útil por lá”. Ou seja, ele mesmo está naarrando fatos que constroem e ampliam a história. Perceba que ele está agregando detalhes ao escopo, através de sua criatividade narrativa (e não pela simples interpretação do personagem)O resto creio que seja particularidade de cada sistema.Mas isso são só 2 centavos. A discussão mesmo vai rolar no Botequim dos Jogos que a galera pode acompanhar aqui https://plus.google.com/u/0/events/cg76haseikh3hmq6nfqbkhvn3oo/100529181073494349616
Mouse Guard e Abismo Infinito honram o narrativismo. Eu entendo da seguinte forma: Todos os personagens possuem dificuldades, porém o jogo te coloca em situações onde estas dificuldades surgem constantemente, porém pode ser individual ou em grupo e aí o próprio jogador iá desenvolver aquele conflito. O que torna o jogo com muitas ações, mas o resultado é um jogo foda e muito bem trabalhado. (Não sei se disse a mesma coisa com as mesmas palavras, mas enfim gostaria de registrar minha opinião).Parabéns ao post, bem legal.
Julio, acho que você está confundindo técnica com objetivo.A “narrativa compartilhada” não é sinônimo nem única definição de narrativismo. Ela é uma técnica, que a teoria define como Postura de Diretor: quando você tem controle na narrativa em coisas além do seu personagem. Eu ainda vou escrever um artigo sobre estas posturas, mas basicamente a postura não está ligada em 1 para 1 em uma agenda criativa.Note que em situações tradicionais, não existe muito espaço para essa postura, para a “narrativa compartilhada”. Muitos mestres estão acostumados a serem a única fonte de criação de coisas no jogo depois que ele começa. Mas isso também não significa que um RPG narrativo que não tenha muito espaço para a postura de diretor não é mais narrativo por causa disso. O excelente e completamente narrativo RPG chamado The Mountain Witch tem pouco espaço para a postura de diretor, mas isso não diminui ele.Agora você tem o RPG Este Corpo Mortal, por exemplo, que foi criado de forma bastante engenhosa para sistematizar essa postura de diretor. Isso torna ele narrativista? Não necessariamente. Mas o que definitivamente torna ele narrativista são as Paixões. E o sistema fala que o jogo deve se basear nas paixões diretamente, o que vai na direção de “problemas humanos” da definição.
Mas se RPG é um jogo de interpretar personagens e você está apenas contando histórias coletivamente não é RPG é um story game. RPG você usa um personagem em um ambiente de jogo. Por exemplo a Fita não é um RPG é um jogo de contar histórias, mas é narrativista.
Eu twitei ontem a minha definição preferida de RPG: “RPGs são jogos em que uma ficção imaginária é o foco do jogo e influencia as opções e decisões no jogo.”Toda essa diferenciação entre RPG e story-game é desnecessária – temos muito mais em comum do que diferenças!
Sei lá se concordo com o que está descrito, minha concepção de RPG Narrativista é a de um jogo onde o mais importante é a interpretação do personagem por parte dos jogadores, independente de regras complexas ou simplificadas… Claro que alguns jogos buscam uma mecânica para permitir essa imersão interpretava ainda mais fácil (como Fiasco e Shotgun Diaries, por exemplo)… Sei lá se é isso ou não, é apenas minha visão e minha opinião não deve ser levado muito em conta já que sou meio avesso a rótulos, vide a discussão indie vs mainstream e agora narrativsta vs simulacionista… No fim, pra mim é tudo rpg, ou eu curto jogar e me divirto ou é um bosta e nunca mais jogo aquele jogo. 😛
Guilherme, eu concordo contigo. Esse lance de rótulos muitas vezes não significa nada. E não existe jeito certo ou errado de jogar – eu não disse de maneira nenhuma que “o jeito narrativista é o jeito certo de se jogar” (aliás, vou editar o post e colocar algo do tipo).As categorizações foram feitas para que possamos entender melhor que acontece na mesa. A interpretação convincente de personagem não está ligada direta a nenhuma agenda criativa, você pode interpretar utilizando gamismo, simulacionismo ou narrativismo, e eu mesmo consigo jogar de qualquer uma dessas três formas e me divertir.
O problema do Big Model é que ela surgiu de uma tentativa do Ron Edwards (e amigos) em categorizar os jogos existentes em um modelo teórico sério, mas sem se preocupar em fazer isso de forma cientificamente correta. Ela se baseia unicamente em teorias vindas de uma comunidade com uma série de conceitos já estabelecidos que eles consideravam verdadeiros, sem haver algum tipo de verificação ou confirmação que não seja baseada na opinião pessoal dos autores. Dá pra notar isso nos próprios artigos do Edwards, que tende a se tornar vago quando faz alguma associação não muito clara ou defende algum gosto pessoal.Não é de estranhar que ela tenha caído em desuso, mesmo que alguns termos continuem sendo usados como adjetivos baseados nos gostos pessoais de cada um (narrativismo, simulacionismo e gamismo provavelmente são as três palavras mais repetidas). Acredito que a teoria tinha algumas idéias interessantes, mas na maior parte ela só serviu para criar termos e conceitos gerais que foram sendo modificados e adaptados pela comunidade dos rpgistas como um todo. Na minha interpretação, gamismo foca o jogo e a vitória através de objetivos mensuráveis, simulacionismo tenta criar um sistema que permita simular a experiência de viver naquela ambientação, enquanto narrativismo foca no uso de mecânicas que reforcem o conceito do gênero/história. Mas essa é uma interpretação pessoal, criada pelos pontos principais que percebo nos jogos que se definem ou são definidos de acordo com esses três termos.
Se bem entendi, “Narrativiso” é mais a filosofia de como seguir o jogo do que um conjunto de mecanismos que incentivem um estilo de jogo, é isso?É que se for assim, seria pegar o capítulo de como conduzir o jogo de BW, FATE, DitV ou qualquer outro “Narrativista” e seguir aquelas filosofias todas no próximo jogo de D&D. Acho estranho se for “só isso”.Também tem o caso do Pendragon, onde o foco do jogo é colocar os jogadores em dilemas pessoais, conflitos morais e crises maníaco-depressivas, mas que é um sistema mais tradicional; você dá um Cavaleiro para um jogador novato e em 10 minutos ele já está representando, chorando, coisa que não acontece com um Paladino de D&D. Esse sistema é tradicional, mas bate metade dos elementos que você citou (e não bate com a outra metade), o que é então Pendragon?
É isso mesmo, Calliban. Narrativismo é isso que descrevi acima, com base na teoria do Big Model. E é simples desse jeito mesmo, e pode ser feita em qualquer RPG, desde D&D oldschool, até Dogs in the Vineyard. Eu tenho certo temor de dizer que FATE é principalmente narrativista, pois boa parte do livro são conselhos de como “planejar uma história”, o que vai contra o narrativismo. Mas de qualquer forma, você pode utilizar os aspectos para fazer um jogo narrativista bem bacana.A questão é que o sistema não está ligado diretamente a agenda criativa. O que você tem são sistemas que apóiam uma ou outra agenda criativa através de suas regras. Tentar jogar Dogs in the Vineyard de maneira simulacionista ia dar uma dor de cabeça nervosa.Gerar drama e uma boa história, como é o caso do Pendragon, não significa que o sistema seja narrativista. Existe outra agenda criativa, que é o simulacionismo, que se foca na exploração, ou seja, nos diversos elementos imaginários, ao invés de ter uma agenda metagame (como o de problemas humanos do narrativismo ou o “ganhar” do gamismo). Esta exploração pode ser focada no sistema (no caso do GURPS), no cenário (como Call of Cthulhu ou Pendragon), nos personagens (como o Vampiro), na situação ou na cor (me faltam exemplos desses).Repare que o “narrativismo” não significa muita coisa mesmo. Eu escrevi um artigo na tentativa de alinhar as conversas sobre história e RPGs narrativos que andava tendo por aí, colocar definições na mesa para facilitar a conversa dos elementos. Se for interessante, posso tentar escrever algo sobre as outras agendas criativas, mas para isso preciso ler bastante delas.
Já que a discussão continuou no twitter, deixa eu ilustrar minha opinião com modelos de design diferentes. Usando Game of Thrones como ambientação, como seriam 3 jogos, cada um seguindo um dos modelos:-Gamista: O jogo teria elementos que permitem avaliar e registrar a progressão de forma clara, como um sistema de classes com níveis. Você avançaria vencendo algum tipo de desafio perceptível e claro, que lhe daria um prêmio bem definido. Como derrotar oponentes numa batalha, o que renderia XP e te tornaria melhor naquilo que sua classe/arqueótipo define como sua especialização;-Simulacionista: Ele tentaria simular como seria a vida de alguém nesse mundo. O jogo tentaria dar regras para coisas como tipos de armas diferenciadas e como elas interagem com os diferentes tipos de armadura, como o rendimento das plantações variam de acordo com o local onde cada domínio se encontra, teria regras para variações físicas de acordo com origem, contabilizaria coisas como modificadores de reação entre personagens de acordo com suas famílias e seus antepassados;-Narrativista: Tentaria enfatizar os temas da série e dar mecanismos que facilitem a criação de histórias similares aos dos livros/série de televisão. Supondo que o autor do jogo considerasse que o tema das intrigas e relações entre personagens são algo importante, o jogo poderia ter uma mecânica de resolução de ações que facilite ou dificulte os resultados de uma ação de acordo com o relacionamento estabelecido entre personagens. Continuando o raciocínio, se o autor considerasse que traições são um ponto importante, poderia ser mais fácil realizar uma atitude que gere uma atitude negativa contra alguém que era seu aliado até aquele momento.Nota que a minha interpretação de narrativismo não é que “narrativismo foca a história”. É “narrativismo tem mecanismos que favorecem/facilitam a elaboração de histórias com dentro de um certo gênero/tipo de história”.
Continuando a discussão…E se o tema da série/história fosse baseado em aspectos de simulação? Por exemplo, alguém poderia jogar este jogo com a mentalidade de que ele precisa fazer relacionamentos, política e intrigas para estar simulando corretamente o “espírito do jogo”. O resultado final seria uma história semelhante ao tema do livro/série/material fonte, porém teria uma base simulacionista para criar este tipo de história.Essa já era minha opinião, que a maioria das mesas que foca “a história e a interpretação” na verdade são de simulacionismo, e não narrativista. Ainda acho que utilizar a história como método de julgamento é meio falho, pois ela não é o meio, é o fim. Você não joga pensando em elaborar uma história, você joga para tomar decisões e agir de certa forma, que depois do jogo, olhando para trás, forma uma história.
Aí depende da forma como isso seria feito. Se ele puxar pra tentativa de recriar um personagem/ambientação como foco, ele puxaria pro simulacionismo. Seria como ter uma lista grande de opções de manobras sociais, modificadas por fatores como origem, sexo, alianças, títulos, etc. que geram uma fórmula utilizada para calcular sua chance de sucesso numa determinada situação.Ou puxando pra outro exemplo, como L5R lida com a honra. A honra é contabilizável e existe uma lista de ações definidas que aumentam ou diminuem sua honra pessoal. Além disso, ela é modificada por fatores como seu clã/profissão, que permitem alterar a utilização e a velocidade de ganho/perda dessa característica. Isso torna a honra um elemento contabilizável, mas que não altera de forma significativa o desenrolar da história em qualquer aspecto mecânico fora do âmbito “poderes de classe/vantagem que explorem Honra como bônus”. A honra só se torna importante pra história se o Mestre escolher reforçar isso através da narração.Voltando ao exemplo inicial que você deu, se o sistema desse um suporte maior para o gênero de histórias de política e intrigas, ele seria (na minha interpretação) mais narrativista. Usando o Smallville que estavamos discutindo antes, ele usa uma série de mecânicas que favorecem que o personagem interaja com os outros personagens que são importantes para sua história, sejam aliados, amantes, inimigos, etc. É mais difícil interagir com pessoas com quem você não se importa. Da mesma forma, é mais fácil realizar ações que envolvam fatores importantes para o personagem (Honra, Poder, etc.), do que aqueles que ele não se importa tanto. Além disso, a mecânica de resolução de ações envolvendo disputas entre personagens abre a possibilidade de aumentar a importância de uma resolução (investindo mais nela), em troca de um questionamento/alteração na forma como você se relaciona com a outra pessoa ou de alguma crença pessoal sua. Isso simula bem as mudanças de alianças, traições e questionamentos pessoais que os personagens passam. E o que faria bastante sentido num jogo de GoT cujo foco são as intrigas e relações entre personagens.Nota que a idéia de “simular gênero = simulacionismo” é derivado da idéia do Edwards que “prep =/= narrativismo”, o que eu discordo. Ele pressupõe a idéia que um jogo que tenta puxar para um gênero de história específico envolve mais planejamento e mais definição de plot pelo mestre, para reforçar o conceito pretendido. Só que eu posso ter jogos gamistas ou mesmo simulacionistas onde a quantidade de “prep” é mínima. D&D jogado na sua forma mais básica é quase “prep” zero: desenhe uma masmorra, escolha três ou quatro tipos de monstros, escolha onde eles vão estar na masmorra e jogue. Assim como jogos que tentam reforçar um gênero específico e cuja preparação é próxima de zero. Leverage é algo que sempre me vem a cabeça, nessas horas. O prep se resume a criar um problema, um NPC vítima, um NPC de oposição e (se o Mestre quiser) uma reviravolta que ele pode vir a usar.Pra mim essa idéia de “prep = ilusionismo” vem muito da preferência da comunidade onde a teoria foi gerada. Eles preferiam jogos sem preparação e favorecem isso, consequentemente associando isso ao conceito com que eles se identificavam mais.
Kimble, aí eu tenho que discordar de você. Prep não é sinônimo de ilusionismo, e prep não é plot. Você precisa fazer prep para jogar quase qualquer jogo, inclusive narrativistas hardcore como Dogs in the Vineyard ou Apocalypse World, ambos do Vincent Baker e que explicam o prep necessário dentro do livro. Um jogo que você senta e joga é que é prep zero, e nesse sentido tem alguns poucos, como o Fiasco ou Primetime Adventures, por exemplo.Creio que o ponto centro do narrativismo é o protagonismo dos personagens, o que em minha opinião é bastante diminuída com técnicas de ilusionismo ou railroad, e mesmo em aventuras com “múltiplos caminhos” você não vai deixar de andar pelo caminho que o mestre planejou, e não é de fato o real dono de suas ações.Além disso, jogar sem plot definido não significa que o jogo é narrativista. A definição é em duas partes, ter apenas uma não define como narrativista. O sandbox está aí para provar que uma técnica que não utiliza plot pode ser usada como gamista ou simulacionista. E mesmo no caso do sandbox existe prep, porém não possui plot nem escolhas pré-definidas. Mas se não é a falta de plot o que define o narrativismo, o que seria então? Creio que aí está a segunda parte da resposta, em que se fala em “problemas humanos”, mas na realidade poderia ser dito “protagonismo dramático”. Mecânicas sociais não significam que o sistema seja narrativista, porém acredito que o protagonismo dramático saia deste tipo de interação entre personagens mais facilmente do que de outras formas, o que acaba causando essa confusão entre causa e efeito.
Deixa só eu enfatizar que meu ponto principal era que um sistema que reforce um gênero não significa a (a) ilusionismo; (b) simulacionismo.Quanto ao prep, eu discordo que a quantidade de prep seja um elemento definidor porque é algo que você (teoricamente) poderia encontrar nos três modelos. Tirando o modelo sandbox usando um cenário pronto não me ocorre nada para simulacionismo agora, mas um jogo fortemente gamista sem prep é algo bem fácil de fazer. Eu entendo que ele é uma de duas características que definem o modelo de narrativismo no Big Model, mas eu acho que não faz muito sentido apontar algo que pode aparecer nos três modelos.
Kimble, eu concordo contigo: um sistema que reforce um gênero não é por si só simulacionista (agenda criativa) ou reforce o ilusionismo (técnica). Perceba também que simulacionismo não é sinônimo de ilusionismo. Ilusionismo é uma técnica, que é incompatível por definição com narrativismo. A grande questão é: de onde tiraram essa definição? Aí sim acho que entra a questão que você falou, de se basear na experiência das pessoas que estavam discutindo esta teoria, e como eu confessei no twitter, agora eu acho que não vale de muita coisa. Acredito que somente a junção destes dois aspectos, de liberdade narrativa e protagonismo dramático, as pessoas julgaram ser diferentes o suficiente que se tornam incompatíveis com outros estilos. Quem sabe? O que eu percebo é que as definições de agenda criativa são complexas e envolvem várias facetas diferentes em cada caso, o que torna ainda mais difícil compará-las.Pra mim, o problema na definição do GNS vem que se cada agenda criativa é um círculo, cujo tamanho fosse definido pela quantidade de elementos e técnicas possíveis, e as características em comum com outras agendas fossem representadas por intersecções entre estes círculos, o círculo do simulacionismo seria absurdamente maior do que o do gamismo, e o narrativismo seria ainda menor. Se é assim, por que não separar o simulacionismo por tipos? Afinal, quem gosta de simulacionismo focado em exploração de sistema jamais se daria bem em um grupo em que o foco fosse em personagem (Vampiro) ou em cenário (Pendragon). Se a intenção foi categorizar para facilitar a compreensão e a resolução de problemas, neste ponto a teoria é bastante falha.E pra falar a verdade, o mais bacana da teoria é entender as outras partes e entendê-las para compreender o que você valoriza como jogador, e deixar isso claro o suficiente para que seja óbvio que estas coisas são possíveis fontes de problema entre os participantes.
A ideia central está okay, mas ainda não é bem compreendida no texto. Talvez nesses 8 anos desde a publicação se tenha adquirido mais entendimento, mas mesmo assim eu gostaria de fazer algumas observações para tornar público.
Essa lógica de “narrativismo”, “gamismo” e “simulacionismo” diz respeito à construção do RPG, ou seja, na forma com as suas mecânicas são construídas e publicadas. Ela surgiu mais como uma crítica à sistemas genéricos, do que uma definição específica dos tipos de role playing, defendendo a tese de que esses sistemas falham por não serem desenhados levando-se em conta esses três aspectos de jogo. Assim, ele meio que tenta mudar o paradigma dos game-designers, mostrando que os jogos de mais sucesso são aqueles que constroem sua mecânica observando o gosto do público que tende a um desses três tipos de jogos, como é o caso, por exemplo de Dungeons & Dragons e Storyteller.
A perspectiva específica do “narrativismo” é aquela em que as mecânicas do jogo são construídas para promover a formação de uma narrativa, e para criar backgrounds para que esse “problemas humanos” que você menciona possam ser trabalhados.
Em jogos narrativistas é preciso que existam regras que ajudem a construção de personagens bem elaborados com elementos que vão além dos seus atributos e perícias. Coisas como antecedentes, vantagens e desvantagens, aprimoramentos, background, etc, são elementos mecânicos que ajudam na criação de personagens mais elaborados que possibilitam essa formação narrativa da campanha e a exploração de situações em que os problemas humanos serão trabalhados.
O GM não só pode como deve planejar situações em que essas características dos personagens são colocadas à prova, esse é inclusive o maior critério dos jogos narrativistas. Em resumo, se nós vemos um jogo em que e importante estabelecer história de personagens, definir suas características psicológicas, sua história, e elementos que os diferencie dos demais, esse é um jogo narrativista.
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Uma crítica que pode ser feita em toda essa teoria GNS é que ela não consegue retratar especificamente todos os sistemas como pertencentes à um tipo de jogo específico.
Embora seja impossível mesclar gamismo (em que o jogador importa mais do que o personagem, como é o caso do D&D clássico e os RPGs Old School) com narrativismo (nos quais os personagens tem preponderância sobre os jogadores), todos eles tem elemento de simulacionismo pois as regras são adaptadas para simular cenários com carracterísticas específicas.
Salve salve.
Eu não leio mais sobre teoria de RPG há muitos anos, e um dos motivos que me fez perder o interesse é que as discussões em relação ao tema acabam se perdendo.
GNS nunca foi sobre sistemas. Gamismo, Simulacionismo e Narrativismo são uma resposta à pergunta “Por que jogar RPG?”. Apenas isso. Sistemas não são narrativistas. Mas não acredite em mim, leia o artigo original: http://www.indie-rpgs.com/articles/3/
De qualquer forma, se pensar desse jeito ajuda o seu jogo ou o seu design, fique à vontade. Só acho que pra mim, na minha situação, não tem mais muita utilidade. 🙂