O D&D Next está às portas. Dentro de poucos dias, o primeiro produto da série será lançado e aqueles que se adiantaram às compras, poderão em breve tê-los em mãos.
A Wizards of the Coast voltou a produzir artigos mais específicos, com mais detalhes sobre os lançamentos, sobre os produtos e isso vai instigando ainda mais os veteranos jogadores de D&D, ansiosos para ver, pelo menos, como a nova edição vai se parecer.
Observando o site dos magos da costa, me deparei com um excelente artigo e pensei, porque não traduzi-lo? Ele faz uma retrospectiva história dos gêneros de D&D e como, ao longo dos anos ele quebrou as amarras do modelo feudal, fazendo um apanhado dos produtos que foram essenciais para esta mudança.
O artigo foi originalmente publicado por Shannon Alpacline e publicado no site da Wizards of the Coast com o título Beyond Feudalism: Experimental Genres.
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As origens do Dungeons & Dragons datam da Castles & Crusades Society (1970 – 1972), um grupo focado em jogos de guerra medievais. A partir deste grupo, foi concebido o jogo de guerra medieval Chainmail (1972), antes de finalmente nascer como OD&D (1974). Não é nenhuma surpresa que o RPG resultante seja fortemente baseado em combate medieval. Mesmo em seus primeiros dias, D&D experimentou mover-se além do feudalismo, incorporando outros gêneros aos seus mundos medievais. Estes gêneros experimentais culminaram com um par de lançamentos inovadores em 1985 – onze anos após a criação do D&D.
GREYHAWK ORIGINS: 1974 – 1985
No começo, o jogo de D&D era sinônimo do mundo Greyhawk – revelado na série de aventuras iniciada com Steading of the Giant Chief (1978). Através de muitas dessas primeiras aventuras, D&D criou um gênero de fantasia inteiramente novo: exploração de masmorras. As batalhas de Descent into the Depths of the Earth (1978), as investigações de Tomb of Horrors (1978) e as explorações de White Plume Mountain (1978), foram em grande parte distintas da alta fantasia de O Senhor dos Anéis (1939 – 1955) e a fantasia sombria de Fafhrd and the Grey Mouser (1939 – 1988). Elas eram o mais próximo do gênero capa e espada, popularizado pelo trabalho de Robert E. Howard em Conan (1932 – 1936), mas também eram algo inteiramente novo.
A exploração de masmorras, influenciada pelos elementos de capa e espada, eram apenas um aspecto do jogo D&D. Suas origens medievais, herança da Castles & Crusades Society, também apareceram naquelas primeiras aventuras de D&D. The Village of Hommlet (1979) foi a primeira publicação a realmente empurrar este cenário medieval. Ele apresentava um vila inteira e um fosso próximo – juntos formando uma comunidade feudal bem detalhada, de uma forma não vista até aquele momento em AD&D.
O Basic D&D ofereceu outra ambientação feudal alguns meses depois com The Keep on the Borderlands (1979), mas foi realmente o The World of Greyhawk Fantasy World Setting (1980) que fixou a ideia, detalhando vastos reinos cheios de domínios medievais. A capa até mostrava uma série de escudos heráldicos que representavam os vários países.
Este foi o mundo de D&D em sua primeira década de existência: um misto de feudalismo medieval, exploração de masmorras e fantasia gonzo¹.
Se você pegar um módulo de D&D dos anos 1970 ou início 80, ele provavelmente se encaixará em uma dessas categorias – seja ele ambientado em Greyhawk ou não. No entanto, os primeiros dias de D&D foram também tempo de experimentações e muitas outras ideias cruzaram com o cenário principal, em grande parte graças a inclusão de uma tríade de gêneros que variaram a fantasia medieval de D&D.
PULP, HORROR E FANTASIA CIENTÍFICA: 1975 – 1987
O antigo jogo de D&D não estava pronto ainda para criar cenários que fossem além do mundo medieval, então ele experimentou três diferentes gêneros em suas aventuras medievais: pulp, horror e fantasia científica.
O pulp apareceu no D&D, primeiramente graças ao interesse de dois escritores: David “Zeb” Cook e Tom Moldvay. Juntos eles escreveram uma meia duzia de aventuras que exibiam civilizações perdidas, cidades soterradas, selvas proibidas e sociedades primitivas. A mais famosa é The Isle of Dread (1981), que foi concebida para ter um gostinho de Mundo Perdido / Ilha da Caveira.
A aventura pulp mais interessante pode ter sido Castle Amber (Chateau d’Amberville) (1981), que foi uma adaptação licenciada de um escrito pulp de Clark Ashton Smith. Smith também foi conhecido como escritor de horror, e então Castle Amber (com seus lobisomens e membros de família assustadores) também é uma história de horror, um tópico ao qual iremos retornar.
Horror em jogos de D&D pode ter começado com Castle Amber, mas ficou famoso com Ravenloft (1983) de Tracy e Laura Hickman. Esta obra de arte gótica, originalmente escrita como uma aventura de Halloween, possuía uma atmosfera pesada e pode ter sido a primeira aventura a realmente colocar o medo nas aventuras de D&D.
O gênero de horror é notoriamente difícil de administrar bem, então ele não recebeu muita atenção da TSR após Ravenloft, mas reapareceu nos anos 90, quando a TSR finalmente criou confiança suficiente para criar cenários baseados em alguns de seus gêneros não tradicionais.
A fantasia científica fazia parte do DNA do D&D desde o seu começo, graças as terras de Blackmoor de Dave Arneson, que apresentou tecnologias estranhas de todos os tipos. A despeito disso, ela não teve muita atenção da TSR nas primeiras publicações, com excessão do infame Expedition to the Barrier Peaks (1980), que deu aos jogadores a oportunidade de investigarem uma espaçonave caída. Além dela, os primeiros jogadores de D&D que se interessaram por fantasia científica tinham que procurar material publicado pela Judges Guild e Grimoire Games, ambas utilizaram alinígenas e tecnologias nos anos 70 e 80.
Então chegamos ao ano de 1985 – um marco para o D&D. Este foi o ano em que o jogo verdadeiramente moveu-se para além de suas origens medievais, iniciando com uma adoção mais sincera do gênero de fantasia científica. Em grande parte isso se deu através da aventura Earthshaker! (1985) do Basic D&D, que apresentou robos monstruosos, e Where Chaos Reigns (1985), sobre intrusos alienígenas. Então, Arneson retornou brevemente a escrever para a TSR e revelou o escopo da fantasia científica encontrada em Blackmoor nas aventuras “DA” (1986 – 1987). Fantasia científica desapareceram dos mundos de Greyhawk e Mystara depois dos anos 80, embora isso tenha ocorrido em parte devido a criação de outro cenário não tradicional que abraçou o gênero.
Seguindo para o outono de 1985, a TSR experimentou com os gêneros pulp, horror e fantasia científica. De fato, as publicações de horror e fantasia científica continuaram com livros como Ravenloft II: The House on Gryphon Hill (1986) e City of Gods (1987). No entanto, estes gêneros apareceram como variações menores dos cenários existentes de D&D, como Blackmoor, Greyhawk ou Mystara, ou em aventuras totalmente genéricas como Ravenloft.
Para o D&D dar o próximo passo além das fundações feudais, ele tinha que criar novos mundos que olhassem para o D&D de um novo jeito. Isso aconteceu não uma, mas duas vezes nos últimos dias de 1985.
THE ADVENTURES OF FAFHRD & THE GREY MOUSER: 1985–1996
Assim como a fantasia científica, a fantasia sombria foi parte do DNA do D&D desde o começo. Afinal, os livros de Fritz Leiber foram listados no Appendix N da lista de inspirações do Dungeon Master Guide original (1979). No entanto, a TSR não teve um escritor de aventuras que tivesse interesse em escrever esse tipo de módulo… até que eles optaram por produzir aventuras licensiadas diretamente baseadas nos trabalhos de Frank Leiber.
Lankhmar: City of Adventure (1985) foi a primeira de uma dúzia de livros de Nehwon publicado pela TRS ao longo dos anos. Ele apresentou um novo mundo que ainda era medieval, mas que era muito mais urbano em natureza (como o nome indica). Em termos, suas histórias eram algumas vezes sombrias – misturando fantasia medieval, escapadas urbanas, aventuras pulp e horror cínico juntos em quantidades variáveis.
No momento, Lankhmar pode não ser visto como um grande passo da TSR, mas a criação de um novo cenário que não seguia as normas da fantasia medieval gonzo de D&D, foi notável. Ele foi um degrau – para um reino muito mais vasto que viria apenas um mês mais tarde.
AS AVENTURAS DO ORIENTE: 1985 – 1990
Antes de 1985, o D&D incluiu poucos vislumbres sobre a visão de mundo não ocidental – mais obviamente no Deities & Demigods (1980), que listou divindades advindas das mitologias índio americana, suméria e asiática. A publicação da TSR de Outubro de 1985, de autoria de David “Zeb” Cook, Oriental Adventures (1985) foi o próximo passo. Apesar de ter sido, de certa forma limitado, ele foi o primeiro cenário não ocidental de D&D publicado pela TSR.
Gary Gygax iniciou a ideia, chamando-o “o segundo volume do Players Handbook” na Dragon 90 (Outubro 1984). Dizendo isso, ele sugeriu que apenas metade do mundo medieval havia sido visto, e que os jogadores de D&D teriam agora a oportunidade de ver o resto.
Quando o livro de Cook tornou-se disponível, ele era na verdade um pouco diferente. Não existiam guerreiros, ladrões e usuários de magia, mas ao invés bushi, ninjas e wu jen. As magias eram diferentes, as raças eram diferentes e até o vocabulário era diferente. Oriental Adventures complementou as regras para um jogo asiático com breves descrições de um novo cenário: Kara-Tur. Pela primeira vez, os jogadores podiam jogar D&D em um cenário muito diferente dos cenários ocidentais Blackmoor, Greyhawk e Mystara.
Este foi outro importante passo em direção a expansão de mundos de D&D que o levaram além do feudalismo ocidental a partir de 1989. Além disso, o mundo de Oriental Adventures foi expandido nos anos que se seguiram, graças a oito aventuras (1986 – 1989), algumas das quais expandiram o mundo de Kara-Tur.
CONCLUSÃO
Os gêneros pulp, horror e fantasia científica ajudaram o D&D a desnudar-se das ideias ocidentais que limitavam sua criação inicial e então Lankhmar e Oriental Adventures quebraram completamente estes limitações. Posteriormente, os gêneros experimentais dos anos 70 e 80 transformaram-se primeiramente em livros de consulta regionais para então tornarem-se os cenários inovadores dos anos 80 e 90 – ambos expandindo o D&D além de sua fundamentação feudal.
Os gêneros experimentais de D&D morreram precocemente, mas apenas por terem sido incorporados aos cenários que fizeram parte da onde expansão seguinte do D&D. Fantasia científica retornou em Spelljammer (1989), horror em Ravenloft: Realm of Terror (1990) e a fantasia sombria em From the Ashes (1992). Seguindo a estrada, a fantasia asiática fez seu retorno em um novo Oriental Adventures (2001), e então o pulp (finalmente) reapareceu em Eberron (2004).
Nós iremos falar sobre estes cenários em um próximo artigo que apresente como o D&D cresceu além de suas origens feudais nas eras da 2ª, 3ª e 4ª edições.
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1 – O termo “fantasia gonzo” refere-se a um gênero que combina muitos elementos
extravagantes de fantasia.
Cara, excelente! Franciolli, você é foda (com o perdão do palavriado)!
Excelente texto. Excelente tradução. Como seus textos e traduções fizeram falta…
Abraço e obrigado por voltar. 🙂
[…] continuidade ao artigo Além do Feudalismo, neste artigo Shannon Appelcline fala um pouco mais sobre a evolução dos jogos de D&D além […]