Eu gostaria de ter termos em português adequatos para estes dois termos, mas não conheço. Talvez “Estabelecer Cenas” e “Aventura nos Trilhos”, mas vou continuar a falar nos termos em inglês até alguma definição melhor aparecer.
O Calliban me perguntou se o scene framing não é fazer railroading. Para quem não conhece, scene framing é a tarefa principal do GM, todo mundo faz, mas poucas pessoas prestam atenção o suficiente. É a tarefa de iniciar uma cena, descrevendo onde estão os personagens, quem está no lugar, descrever o ambiente e o que está acontecendo logo antes dos personagens agirem. Eu não disse que isso era algo básico?
Pois bem, nos RPGs indies, um conselho muito comum é de fazer um scene framing agressivo, não perder tempo com picuinhas e ir direto ao ponto. Ah, e além disso, terminar as cenas cedo também, para evitar que fique tedioso. Como o Jogador Sonhador me disse uma vez, arrive late, leave early.
Podemos pegar como exemplo um personagem que está dentro de uma masmorra que já foi liquidada: nenhum monstro está se mexendo dentro do local. Ele diz para o mestre “Eu quero ir para a cidade comprar tochas novas”. O personagem sabe voltar para a cidade, o caminho não tem muito perigo. Um scene framing mais tradicional pode envolver o personagem tendo que achar o caminho de volta da masmorra, depois fazendo teste para não se perder de volta para a cidade, depois ele chegando na cidade, procurando a loja, etc etc etc. Pretty boring.
No mesmo caso, um scene framing agressivo poderia simplesmente ser o GM falando: “Ok, você sai da masmorra e caminha de volta para a cidade. Depois de várias horas, completamente exausto e faminto, você está na loja que estava procurando. O vendedor vê a tocha em sua mão e fala: ‘Quer levar? São duas peças de cobre’.”
É claro que é um exemplo simples, sem nenhuma emoção, mas muita gente torceria o nariz e diria que assim o jogo “perde a graça”. A intenção é justamente o contrário: ir direto para a parte que interessa, e cortar a ladainha. Tentar transformar o RPG em algo mais divertido do que 20 minutos de diversão em 4 horas de jogo.
Mas quando você estabelece uma cena de forma agressiva, sempre existe o risco de você compreender errado a intenção do jogador. “Não, eu não queria ir direto na cidade! Estava pensando em passar no lago antes e pescar uns peixes para vender! Calma aê po!”. Nesse ponto, o scene framing pode ser negativo, se o GM não for flexível e não entender direito a intenção dos jogadores. Ele estaria sendo usado então para limitar as opções de ações dos jogadores, ao invés de ir direto para o mais interessante.
O segredo é o de sempre: comunicação, comunicação, comunicação. Pergunte aos jogadores, tente compreender o que eles querem, e se você errar e for muito agressivo, sempre ceda aos jogadores e volte para o ponto que eles quiserem. Nunca use isso para tirar a liberdade dos personagens.
Acho que nesse ponto o D&D é insuperável. Para que perder tempo com bobagens quando você pode ser jogado diretamente no meio de um combate sangrento?Para que fazer o caminho em uma floresta onde nada acontece? Passemos direto para a ação, muito mais emocionante.Quanto a questão do “entender errado”, eu sempre pergunto aos jogadores várias vezes, para ter certeza se o que eles querem é exatamente sair de um ponto A para um ponto B, sem escalas ou conexões, depois disso, que dura muito pouco, vamos para a porrada.
Franciolli, o D&D4E melhorou bastante isso através da idéia de encontros: cada região tem algo interessante acontecendo. Mas nos antigos, era normal perder uma quantidade enorme de tempo com uma sala vazia. Em um filme ou livro, isso é perda de tempo, e na minha opinião no jogo também. Ritmo é mais importante do que imersão e “realismo”.
O Smallville RPG meio que condena as cenas de ligação (todo tipo de cena que não tem chance de conflito) e encoraja mecanicamente o jogador a preencher as lacunas com os plot points que ele ganha por ser jogado de lá pra cá pelo mestre.Nele, a aventura é narrada como um episódio de um “one-hour-drama”. As cenas devem ser curtas e devem ter a possibilidade de conflito. Se você tem uma idéia incrível, não prepare terreno lentamente: jogue a idéia direto, logo no começo da cena.Pelo contexto e exemplos do livro, a impressão é meio pesada. “Seu personagem está entrando na sala com papéis daquele caso e pensando em como seu irmão poderia estar envolvido em tudo isso, quando percebe que a secretária nova está fuçando em sua mesa”. Claro que eles dizem que o ideal é balancear, mas o fato de o mestre ter essa liberdade de estabelecer cenas bruscamente pode ser muito mal usada, e criar um railroad inverso, onde o set-up da cena empurra uma dada resolução, e por ai vai.
Então não respondi nada com nada, né? Viajei, sorry =/Em que página está isso no livro? Eu li mas não estou lembrado dessa parte exatamente.
PG 51, no Framing Later Arrivals. O jogador fala que quer pesquisar papeis, o mestre já coloca ele saindo da sala e dando de frente com outro personagem que está curioso pra saber o que ele está fazendo, e depois rola pra ver se ele conseguiu encontrar algo ou não. Esse tipo de set-up onde o mestre já joga o pepino na mão dos jogadores.
Ok, acabei de ler o exemplo do livro, e acho que o assunto se encaixa com o post acima.O problema do exemplo dado no livro e que você comentou é que ele é dado sem contexto. No jogo, existem acontecimentos que levaram a este curso de ação e que justificam o outro personagem curioso, etc. O que o scene framing fez neste caso foi pular a parte tradicional de “ok, você chega na sala, ela está bagunçada, rola aí para ver se você acha os papéis. Ok, agora que você está saindo com os papéis na mão, a Lois vem até você perguntar o que estava fazendo”.No exemplo dado, o jogador ainda não rolou para descobrir se ele achou a pista nos papéis, e a rolagem apenas aconteceria quando a Loius o questionar. É uma questão de estilo, mas não acho que é railroad, pois o resultado é o mesmo.Mas é como eu comentei, se o GM usar isso “para o mal”, pode rolar railroad sim. Mas no geral é uma questão de estilo e conforto para os participantes.