Eles são, na minha opinião, um dos elementos mais interessantes da quarta edição, mas como Mike Mearls,  líder do departamento de desenvolvimento de D&D diz, para dominá-lo é preciso tempo, prática e experiência prática.

Ainda segundo Mike, até mesmo o departamento de desenvolvimento da Wizards of the Coast sofreu as mesmas dores de cabeça que mestres ao redor do mundo, para dominar os conceitos dos Desafios de Perícia. Os antigos narradores, que teoricamente não precisariam aprender nada, voltaram para trás do escudo do mestre para aprender mais uma mecânica enquanto as partidas se desenrolam.

Regras Básicas de um Desafio de Perícias

Existem algumas considerações que devem ser observadas quando se lida com desafios de perícias.

1. Os desafios de perícia são como lutas. Eles funcionam melhor quando o mestre e os jogadores desejam que uma aconteça.

Vamos supor que você preparou um combate para a sua próxima aventura. Os personagens precisam atravesar uma ponte e existe troll imenso e faminto no caminho. Hora de uma luta!

Isso é, a menos que os personagens decidam passar furtivamente pelo troll ou suborná-lo com um barril de cerveja. Um bom mestre sabe que algumas vezes é melhor levar em consideração o plano maluco dos jogadores, principalmente quando eles são auxiliados por alguns 20 naturais em jogadas de Stealth e Diplomacy. Um bom mestre pensa de forma independente e recompensa idéias interessantes e inteligentes.

A mesma lógica se aplica aos desafios de perícias. Há uma chance de que uma idéia realmente boa supere o seu desafio de perícias? Não se lamente! Isso é ótimo. É importante lembrar que D&D é um jogo de criatividade e imaginação. Se existir apenas uma forma pré-estabelecida de sucesso, alguma coisa está errada. Quando você desenvolver um desafio de perícias, esteja preparado para ele poder ser completamente ignorado ou para o grupo falhar miseravelmente. Dessa forma o jogo anda, independente do que aconteça com o desafio.

2. Desafios de perícia são como lutas. Se ficar no mesmo lugar tentando a mesma coisa repetidas vezes for o melhor plano, você deve voltar ao quadro de planejamento.

Os desafios de perícia são mais do que um jogada de perícia prolongada e obsessiva. Os melhores desafios abarcam uma ampla variedade de perícias e habilidades. Digamos que um personagem está preso numa masmorra quando a saída colapsa. Cavar a sua saída é um desafio de perícias?

À primeira vista poderiamos dizer que sim. O grupo tem que trabalhar em conjunto para remover o entulho. Athletics e Dungeoneering parecem adequados para medir o nível de sucesso do grupo. Ainda assim, em jogo esse desafio seria entediante. Os personagens que se destacam nessas perícias fazem as jogadas enquanto os outros ficam de braços cruzados, procurando qualquer desculpa para evitar remover o entulho. Independente de como você remova o entulho, os personagens tem que fazer testes para colocá-lo de lado. Se o seu desafio de perícia tem um gargalo em potencial – basicamente sustentada em uma perícia – você precisa repensar o encontro.

3. Os desafios de perícia continuam sendo como lutas. Uma variedade de opções a torna atrativa.

O Dungeon Master Guide aconselha a misturar artilheiros, soldados e os outros papéis de monstros nos encontros de combate. A mistura de criaturas torna a luta divertida porque varia o desafio e permite combinar as habilidades dos personagens. O paladino segura o soldado hobgoblin, o ranger procura nas sombras pelo goblin assassino, enquanto o mago libera suas magias sobre o hobgoblin xamã. Cada personagem tem a chance de brilhar e o grupo tem que agir como um time para responder a altura a ameaça que cada monstro representa. Todos tem basicamente o mesmo objetivo, detonar os monstros, mas cada personagem atinge esse objetivo de várias formas diferentes.

Esta parte do conselho se parece com a segunda regra, mas existe um diferencial importante aqui. Não é suficiente simplesmente pegar uma ampla variedade de perícias. O mestre precisa criar uma ampla variedade de sub-desafios e obstáculos dentro do desafio. Um bom desafio de perícia consiste de um número de tarefas diferentes e que se complementam para formar um encontro divertido. Os personagens devem sentir que seus personagens possuem várias opções e que suas decisões são importantes. De outra forma, um desafio de perícias se torna uma sucessão enfadonha de jogada de dados.

4. Os desafios de perícias são finalmente diferentes de lutas. Eles podem (e devem) cobrir horas ou até mesmo dias de progresso.

Pense quanto tempo o grupo pode levar para sobrepujar o desafio de perícias. Se a sua pergunta puder ser respondida em minutos, talvez uma simples jogada de perícia resolva. Se você designar um desafio de perícias para cobrir um dia, ou mesmo uma semana de esforços, você a amplia a variedade dos obstáculos individuais dentro de um desafio como um todo, e amplia o número de perícias a serem utilizadas.

Quando em dúvida, comece um desafio de perícias uma cena ou duas antes do que acha que ela deveria começar e extenda a cena até depois de onde acha que deveria parar. Deixe os personagens usarem as perícias tanto para auxiliar em seus esforços iminentes como para selar o acordo depois que tenham se deparado com a primeira cena do desafio. Quanto maior for o número de formas através das quais os personagens podem se engajar num desafio, maior a quantidade de perícias que podem ser utilizadas e ao mesmo tempo, dá aos personagens mais chances de fazer escolhas importantes para moldar o resultado do desafio.

Construindo um Desafio de Perícias

Embora todos esses conselhos pareçam legais, eles são completamente sem valor sem exemplos práticos. Vamos usar um exemplo de um desafio de perícias na minha campanha de Grayhawk, usando os quatro princípios delineados acima.

A cidade de Suderham é a base de operações dos Escravagistas, um grupo maligno de criminosos que atacam vilas e cidades costeiras. Em determinado ponto na minha campanha, os personagens terão que viajar para Suderham e se misturar com seus habitantes. Como uma cidade dedicada ao mal sem arrependimentos, Sunderham é um local perigoso para aventureiros. Se os personagens quiserem sobreviver, eles precisam permanecer fora das vistas dos guardas. Aqui está como eu implementei esse desafio usando as quatro regras acima.

1. Os desafios de perícia são como lutas. Eles funcionam melhor quando o mestre e os jogadores desejam que uma aconteça.

Como é possível ver, o primeiro passo se concentra em um simples conselho que mestres tem seguido por 30 anos. Esteja pronto para improvisar e nunca se engane, pensando que os personagens irão seguir o caminho que você espera. Embora esse conselho pareça óbvio, lembre-se que os desafios de perícia podem parecer tão flexíveis que os personagens não podem escapar deles.

Eu assumi que os jogadores vão querer evitar chamar atenção sobre si, mas como um mestre experiente sabe, é impossível prever o que os jogadores poderão fazer. Neste caso, eu tenho uma saída fácil caso os personagens adotem uma aproximaçao barulhenta, odiosa e violenta ao invés de uma aproximação calma, sutil e suave. A aventura pode facilmente se tornar uma sucessão de batalhas ou uma caçada se os personagens começarem a cortar cabeças. Em adição ao desafio de perícias, eu devo ter alguns mapas das ruas para os encontros, algumas patrulhas de guardas planejadas e talvez até mesmo o esqueleto de um outro desafio de perícias para uma caçada. Eu também terei algumas notas de como a cidade reagiria a um ataque de um grupo de aventureiros. Se os personagens optarem por magia e espada ao invés de furtividade, eu estarei preparado para lidar com isso.

A real compensação deste passo é que ele força você a pensar sobre como o desafio pode falhar sem arruinar a aventura. Falhar em um desafio pode levar a uma aventura mais complexa e difícil mas isso não induz as coisas a uma parada.

2. Desafios de perícia são como lutas. Se ficar no mesmo lugar tentando a mesma coisa repetidas vezes for o melhor plano, você deve voltar ao quadro de planejamento.

Pode parecer fácil e cômodo focar apenas em Stealth e Bluff como perícias chave para andar por Suderham, pois a responsabilidade fica sobre um ou dois personagens. Se eu realmente não puder estender o desafio para outras perícias, devo pensar em jogar o desafio todo no lixo ou reduzir sua complexidade. Uma vez que eu quero que este desafio desempenhe um papel chave na campanha, eu não estava preparado para descartá-lo. Ao invés disso eu preciso olhar a lista de perícias e diversificar as opções abertas aos personagens.

Para começar, concentre o desafio em uma única e simples sentença. Aqui está a minha:

“Os personagens precisam evitar serem presos pelos guardas de Suderham.”

Como eu mencionei acima, as primeiras escolhas óbvias são Stealth e Bluff, mas eu quero mais perícias para dar a chance de todos os personagens participarem. Aqui está como fiz isso:

Primeiro, designe um número de perícias chave igual ao número de personagens no grupo + 2. Se existirem mais personagens do que perícias úteis, você estará automaticamente fazendo com que alguns personagens não possam contribuir a não ser usando a opção de ajudar o outro.

Segundo, designe uma variedade de perícias. Athletics é uma excelente perícia para desafios, pois quatro das oito classes do Player’s Handbook a possuem em suas listas. Nature e Perception podem parecer escolhas óbvias para muitos desafios, mas apenas duas classes tem acesso a elas. Observe a tabela na página 178 do Player’s Handbook, um sumário com as perícias e as classes que as oferecem. Planeje de forma que metade das perícias a serem utilizadas estejam nessa seleção, que três os mais classes possuem em sua lista de perícias:

  • Arcana
  • Athletics
  • Diplomacy
  • Dungeoneering
  • Endurance
  • Heal
  • History
  • Insight
  • Intimidate
  • Religion
  • Streetwise

Aqui existe um sumário das perícias “raras”, aquelas oferecidas apenas por duas classes:

  • Acrobatics
  • Bluff
  • Nature
  • Perception
  • Stealth
  • Thievery

A lista é curta, mas inclui um número de perícias que se parecem com perícias chave para um monte de desafios de combate. Ele englobou ambas as perícias que eu pensei para o meu desafio de perícias, mostrando que obviamente eu preciso acrescentar mais perícias à mistura.

Em adição, “raridade” não é a única medida. Existem algumas perícias divididas pelo papel, com uma lista de perícias, como se mostrado na lista dos papéis das classes no Player’s Handbook.

Defender: Endurance*, Heal, Intimidate
Striker: Nenhuma.
Leader: Diplomacy*, Heal, History
Controller: Arcana*, History*, Religion*

Uma vez que o mago é o único controller do Player’s Handbook, essa lista de perícias de classe consiste nas perícias de mago que usam Inteligência. Um mago é bom com essas perícias, independente de tê-las treinado. Além disso, um asterisco (*) próximo a perícia indica que ela usa um atributo útil para todas as classes naquele papel.

Como você vê, a lista de perícias compartilhadas por papel é lamentavelmente curta. As classes presentes no grupo representam papel preponderante nas perícias que o grupo tem disponível. Diferente de um encontro de combate, que o balanço das regras se asseguram que o grupo possa lidar com quase qualquer mistura de critérios, os desafios de perícia não possuem critérios para dizer claramente com o que os personagens podem lidar. É de suma importância que o mestre use as listas acima e o seu conhecimento dos personagens, como uma comparação real dos desafios.

A partir desse ponto, eu tenho uma partida inicial para o desafio. Eu conheço o propósito do desafio, eu estou preparado para qualquer número de turnos não planejados que aventura possa ter e eu sei que preciso diversificar a minha lista de perícias críticas. Isso pode até não parecer muito, mas encontrar os pontos problemáticos de um desafio de perícias antes de jogá-la é o primeiro grande passo.

No próximo artigo, passaremos as próximas duas regras dos desafios de perícia e mostrar-lhes como resolvemos todos os problemas que as primeiras duas regras apresentaram para mim.


Sobre o autor
Mike Mearls é o líder de desenvolvimento para o jogo Dungeons & Dragons. Seus créditos recentes incluem H1: Keep on the Shadowfell e o Player’s Handbook 2 (v.3.5).

Sobre o tradutor
Franciolli Araújo é coordenador do Grupo Trampolim da Aventura. Seus créditos recentes não incluem nada na área de RPG!

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Escrito por Franciolli Araújo
Esposo de Paula, pai de Pedro e Nathanael. Professor e pesquisador na área de mineração. Um sujeito indeterminado que gosta de contar histórias e escrever sobre elas e acredita que o RPG é o hobbie perfeito, embora existam controvérsias.