Bem-vindos novamente a nossa série contínua de artigos sobre desafios de perícias. Como em qualquer série, essa parte não fará muito sentido a menos que você tenha lido as partes que vieram anteriormente. Você deve ler as partes 1 e 2 antes de mergulhar nesta parte, tanto para relembrá-la quanto para criticá-la. Conseqüentemente eu vou parar de pedir que vocês leiam a série inteira, mas as primeiras partes estão firmemente ligadas.

Nas últimas duas colunas eu escrevi sobre o processo que usei para colocar simultaneamente um desafio de perícias. Os passos que eu cobri até agora são os mais fáceis. Consiste basicamente em observar os personagens, pensando sobre as perícias necessárias para sobrepujar o desafio e tentar construir o maior número de possibilidades desde o começo. Agora vem a parte realmente difícil: colocar todas essas coisas juntas para que a sua campanha fique melhor. Os passos que eu trabalhei até agora são razoavelmente simples, requerendo alguma reflexão e planejamento, mas nada inovador.

Então vamos direto ao assunto, na minha regra final sobre desafios de perícias.

4. Os desafios de perícias são finalmente diferentes de lutas. Eles podem (e devem) cobrir horas ou até mesmo dias de progresso.

O fator tempo é fácil de negligenciar quando criando um desafio de perícias e isso é um erro que pode transformar um desafio atrativo em série repetitiva de lançamento de dados. Você sabe que perdeu o grupo e bagunçou o desenvolvimento de um desafio de perícias quando os jogadores estiverem fazendo qualquer coisa, menos jogando. A melhor coisa a ser feita contra isso é dividir o desafio em várias cenas, cada uma oferecendo uma aproximação diferente e geral em relação ao problema. Variando a situação e o ambiente, você mantêm as coisas revigoradas, mesmo quando o grupo usa as mesmas perícias. Existe um mundo de diferença entre um teste de Diplomacy contra um guarda bêbado que confunde o meio-orc do grupo com seu melhor amigo e o mesmo teste contra o dono de uma loja intrometido querendo um suborno. Se cada cena for suportada por um ótimas cenas de interpretação, o desafio de perícias mais simples se torna uma experiência variada e interessante.

Estender um desafio de perícias por um período de tempo maior, traz importantes benefícios: ela permite você infligir mudanças radicais ao desafio sem forçar o senso de crença dos jogadores. No exemplo acima, seria ridículo para o grupo correr atrás de vários NPCs, cada um requerendo uma jogada de perícia, durante uma visita de 15 minutos a taverna local. No entanto, se esta busca vier aos personagens durante um dia inteiro, com os personagens percorrendo a cidade inteira em busca de informações, o jogo fará mais sentido.

Aqui estão duas regras relacionadas a 4ª regra. Elas surgem quando você abraça a idéia de um desafio de perícias atuando numa escala de tempo diferente de um combate.

4A. Cada jogada de perícia em um desafio deve fazer uma dessas coisas:

  • Introduzir uma nova opção que os personagens podem perseguir, um caminho de sucesso que eles não sabiam que existia.
  • Mudar a situação, como enviar os personagens a uma nova localidade, introduzindo um novo NPC ou adicionando um complicador.
  • Garantir aos personagens repercussões tangíveis para as falhas ou sucessos das jogadas (como apropriado), aquelas que influenciam suas decisões subseqüentes.

Se você pensar sobre isso, a mesma situação se aplica numa batalha. Se o mago frita os orcs com a sua bola de fogo, o ladrão se esgueira por trás do xamã e o ataque ao invés de esperar pela ajuda do guerreiro. Durante uma batalha, as ações tomadas pelos personagens e monstros montam o cenário para o turno do próximo a agir. Em uma boa luta, a situação muda constantemente. A mesma coisa se aplica aos desafios de perícias. Eles se tornam melhores quando mudam e reagem as decisões dos personagens.

4B. Os personagens devem sempre ser os participantes ativos de um desafio de perícias.

Esse é um ponto sutil, mas um que pode significar a diferença entre o sucesso e a falha. É também um ponto que eu percebi apenas recentemente. De fato, eu não tinha idéia que fosse escrever isso quando comecei essa série. Eu não deveria ficar surpreso com isso, pois como vamos melhorando com os desafios de perícias, eu terei que revisar ou revisitar esses artigos no futuro.

Colocar os personagens no papel de agressores, simplesmente significa empurrar os NPCs para o papel passivo de bloqueios, pessoas que ficam entre os personagens e o sucesso e forçam os personagens a serem os catalisadores da ação. Como uma série de conselhos de jogo, isso parece legal, mas implementá-lo pode ser difícil. Isso é melhor mostrado num exemplo.

Os personagens precisam escapar de um grupo de perseguidores. É fácil padronizar que os personagens façam os testes de Endurance e Athletics para ver se eles são capazes de fugir a perseguição, mas isso os empurra para uma jogada passiva. Os guardas são o grupo ativo nessa configuração: eles caçam os personagens e os personagens fazem testes para não serem capturados. Ao invés disso, estabeleça o desafio de forma que os personagens sejam os agressores. Eles devem fazer testes para frustrar os perseguidores, como por exemplo, jogando obstáculos no caminho dos guardas, tomando uma rota que desencoraje a perseguição (escalar uma construção e correr por sobre o telhado), começar uma briga entre duas gangues ou mesmo iniciar um incêndio que sirva como distração.

Neste exemplo, você poderia permitir que os personagens façam jogadas simples para simplesmente correr mais que os guardas, mas essa deveria ser uma opção dentre muitas. Mesmo assim, a melhor opção é fazer com que sejam os personagens que estão criando obstáculos que os guardas não possam sobrepujar. A jogada de Athletics não representa apenas que o personagem está correndo rápido. Ao invés disso, ela permite ao personagem esquivar-se através de uma rua apinhada de gente facilmente, enquanto os guardas lutam para abrir caminho.

Colocar os personagens no papel ativo tem um efeito importante no planejamento, na apresentação e no engajamento do jogadores. Isso força os jogadores a melhorar, fazendo planos ao invés de simplesmente sentar-se e reagir aos NPCs. Isso também o empurra a criar vários caminhos e opções. Quando os personagens são o grupo passivo no desafio, é muito fácil deixar a lógica ditar o desafio, e repetidas jogadas de perícia representam a melhor forma de reprovar um desafio.

Chega de falar! Hora de agir!

Se você é como eu, algumas vezes encontra divergências entre a teoria e a prática dos conselhos de jogos. É fácil jogar várias frases com “dever”, “poder”, “necessitar” e “melhor que” para você, mas elas são sem sentido sem uma aplicação prática. Sim, os desafios de perícia “podem” ser divertidos, mas é chegada a hora de fazer um realmente diver
tido.

Eu quero que o desafio de andar pelas ruas de Suderham tenha um papel importante no jogo. Toda vez que o personagem queira mover-se pela cidade, quero que eles considerem onde irão, quão perigosa a caminhada será e qual a melhor forma de percorrer o trajeto. Idealmente, eles possuem vários caminhos para escolher, cada um com um conjunto diferente de perigos.

Escolha: Para Suderham, eu estou criando um mapa da cidade que os jogadores possam usar durante as sessões para planejar os seus movimentos. Em termos do desafio de perícias, o caminho que eles escolherem, determinará as perícias que eles podem usar e classes de dificuldade que eles vão encarar. Além disso, criarei uma série de modificadores por mover-se pela cidade em diferentes horas do dia para criar um sentimento de ambiente vivo.

Repercussões: A medida que os personagens fazem suas ações, eu espero que a situação na cidade se modifique um pouco. Como exemplo, um NPC que eles conheceram aparece novamente para ameaçá-los ou ajudá-los, dependendo de como a situação seja resolvida. Isso alimenta a idéia de que um desafio de perícias é alguma coisa que reage e muda a medida que os personagens fazem suas ações.

Mais importante, as repercussões devem ser mais do que simples ajustes de perícias ou mudanças nas CD. Elas devem ser eventos narrativos que mudam a situação e fazem as novas opções, condições e decisões fluindo pela história do jogo.

Eventos Aleatórios: Para manter o desafio de perícias interessante, eu estou criando uma pequena tabela de eventos aleatórios para cada distrito, para tornar as coisas mais interessantes. Eu gosto de eventos não esperados na mesa de jogo. Isso mantém os jogadores concentrados e isso me mantém concentrado. Para mim, mestrar é muito mais divertido quando eu não tenho idéia de como a sessão pode terminar.

Estrutura: Por último, mas não menos importante, eu preciso olhar para a estrutura de meu desafio de perícias. Muitos mestres se sentem muito mais confortáveis quando fazem isso primeiro, mas eu prefiro olhar para a estrutura depois de ter vindo com as idéias, mas antes de tê-la colocado no papel.

A estrutura são as porcas e os parafusos da construção de um desafio. Como o desafio começa? Como ele termina e o que acontece enquanto isso?

Eu gosto de dividir desafios de perícias em três sessões, imaginativamente intitulados de abertura, meio do jogo e fim. Cada sessão requer cerca de um terço dos sucessos para completar o desafio e passar por ele.

A abertura inicia o desafio de perícias, deixa claro qual o objetivo e apresenta a base para as primeiras perícias ou opções para os personagens. Em meu desafio de perícias, estou desenhando um mapa da cidade para os personagens. A medida que eles exploram, eu adicionarei novas localidades ao mapa. Isso serve a dois propósitos. Ele dá um lembrete visual aos jogadores enquanto planejam e serve como uma referência que os permite avaliar os riscos e recompensas que eles poderão enfrentar. Sempre que o desafio começar, os personagens escolhem uma rota pela cidade.

O meio do jogo é o processo atual de mover-se através da cidade. As perícias e os obstáculos que os personagens enfrentarão são determinados pelo caminho que eles escolhem e um ou mais eventos aleatórios que eu jogue. Acredito que irei usar uma jogada de dados para determinar o número de eventos, de 0 a 3, com certos distritos fazendo rolagens mais freqüentes. Em adição, alguns distritos terão desafios que os personagens deverão quase sempre enfrentá-lo. O distrito do dinheiro, onde os escravagistas e seus clientes de elite moram, é muito mais bem patrulhado do que os cortiços.

Finalmente, os personagens precisam entrar nos seus destinos sem chamar atenção para si mesmos. A jogada de perícia final dependerá da natureza de seu destino. Para entrar num templo bem guardado de Gruumsh, os jogadores deverão fazer jogadas de Insight para aprender o padrão das patrulhas de guarda. Athletics e Stealth para esgueirar-se para dentro dos muros do tempo, ou Streetwise para encontrar uma entrada antiga e esquecida para dentro do local.

Outro exemplo (curto)

A lição mais importante a ser aprendida, é que os Desafios de Perícia são muito mais do que várias jogadas de perícias. Coisas como a tabela de encontros aleatórios que estou criando, a opção dos personagens pegarem diferentes caminhos através dos distritos da cidade, tudo isso, aponta para um desafio de perícias dinâmico, envolvente e inconstante. Interação é a raiz do D&D e por isso, também deve ser a raiz dos desafios de perícia.

A primeira vista, isso parece dar um monte de trabalho. Mantenha em mente que o desafio de perícias que estou construindo é grande. Eu espero usá-lo pelo menos em três sessões de jogo. Tudo que foi falado anteriormente funciona da mesma forma para um desafio de perícias mais limitado, você precisa apenas diminuir a extensão.

Por exemplo, digamos que você deseje um desafio de perícias de uma cena que requeira que os personagens tentem uma aliança com o Barão de Karrak, senhor das Colinas Cinzas. A abertura do desafio de perícias pode ser os personagens já a alguns dias na corte, encontrando-se com diferentes funcionários. As pessoas com quem eles se reúnem determinarão as perícias relevantes para esta parte do desafio. No meio do jogo, os personagens atendem a um convite para uma festa dada pelo Barão. Seu sucesso na interação com NPCs específicos determinará suas opções aqui. Novamente, os personagens escolhem com quem falar ou outras ações a serem tomadas. (Um ladrão furtivo poderia esgueirar-se para dentro do estúdio do barão e ler em seu diário uma forma de ganhar a simpatia do barão; ele sabe do diário pois na primeira fase do desafio de perícias, ele usou Streetwise para juntar rumores dos servos do barão.)

Finalmente, o grupo tem uma audiência com o Barão. Suas escolhas, seus sucessos e falhas nas duas primeiras cenas determinam a situação do fim do jogo. Se os personagens embaraçaram o capitão da guarda durante a festa, ele estará presente na audiência para falar contra os personagens. Se eles impressionaram o tesoureiro durante a fase aberta do desafio, ele adverte o Barão que os personagens são poderosos e possuem conexões com muitos outros regentes da região, melhorando o uso de Intimidation.

Em qualquer caso, no final da cena, os personagens estarão a dois ou três sucessos de terminar o desafio, escapando da chance de terem que simplesmente fazer testes após testes de Diplomacy para ganhar a aliança. Suas escolhas através do desafio faz com que ele mude e se transforme, rendendo uma narrativa muito diferente dependendo de sua sorte e talentos.


Sobre o autor
Mike Mearls é o líder de desenvolvimento para o jogo Dungeons & Dragons. Seus créditos recentes incluem H1: Keep on the Shadowfell e o Player’s Handbook 2 (v.3.5).

Sobre o tradutor
Franciolli Araújo é coordenador do Grupo Trampolim da Aventura. Seus créditos recentes não incluem nada na área de RPG!

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Escrito por Franciolli Araújo
Esposo de Paula, pai de Pedro e Nathanael. Professor e pesquisador na área de mineração. Um sujeito indeterminado que gosta de contar histórias e escrever sobre elas e acredita que o RPG é o hobbie perfeito, embora existam controvérsias.