Na primeira parte desta série de artigos, comentei sobre como transformar fracassos em coisas interessantes para a história. Na segunda parte, falei de mais uma técnica que os GMs podem usar para tornar os fracassos ainda mais interessantes em seus jogos. Mas ainda está faltando uma parte fundamental nesta questão: e os jogadores?
Como um jogador, é bem compreensível querer que seu personagem seja bem sucedido em tudo que ele tenta fazer. Nós pensamos nele de uma forma heróica, e não queremos que ele banque o palhaço por causa de um resultado ruim nos testes. Ao mesmo tempo, a maneira tradicional de lidar com regras e testes fez com que as falhas sejam momentos traumáticos e ruins: a história do seu personagem pode muito bem acabar se ele não matar os goblins deste encontro aleatório. Falando francamente, nenhum jogador quer que seu personagem falhe nos testes.
O problema é que esta abordagem não é tão funcional quando se utiliza esta abordagem nova para lidar com os fracassos. O segredo que os RPGs não contam é que toda boa história é criada pelas complicações e privações que seu protagonsita tem que superar. O que é necessário então é que os jogadores adaptem o seu modo de pensar e abracem o fracasso – ousem ser estúpidos, como John Wick falou em seu vídeo:
http://www.youtube.com/watch?v=Ww5wWoap_uQ
Para que isso aconteça, é necessário uma boa dose de confiança dos jogadores no GM – o que talvez explique por que isso é tão raro. Os jogadores precisam estar certos que mesmo que seu personagem falhe, ele não vai falhar por motivos estúpidos ou vai parecer um palhaço na frente da corte. Por outro lado, os jogos não podem apenas ser compostos de fracassos, ou irá rapidamente perder a graça. Podemos dizer que o sucesso é a intenção do jogador se materializando na ficção do jogo, enquanto o fracasso é território do mestre. Um bom jogo tem material dos dois lados interligados e inseparáveis.
Uma maneira bem simples de conseguir mudar este pensamento é separar a sua visão como jogador do seu personagem, e assumir que eles tem objetivos distintos. Seu personagem jamais iria querer que seu irmãozinho fosse sequestrado e feito de refém por necromantes, mas você jogador reconhece o drama e deixa o gancho pronto para o mestre fazer isso.
Neste sentido, o que abriu a minha mente foi um podcast de actual play de Burning Wheel que ouvi da turma do Podgecast. Os jogadores tentavam realizar o que fazia sentido no jogo, sem se importar se a dificulade seria alta ou se a falha era praticamente certa. Por vezes, aconteceu até o contrário: eles se entusiasmavam com a expectativa de uma falha interessante e engraçada no jogo.
Outro podcast bem esclarecedor sobre o assunto foi o Narrative Control episódio 36, que por sinal escutei depois que comecei a escrever esta série de artigos. Nele eles discutem várias experiências que tiveram com os jogadores abraçando o fracasso e deixando o jogo mais bacana por causa disso. Vale a pena escutar.
Como não poderia deixar de ser, darei alguns exemplos de jogos que abraçam esta filosofia em seu design. O mais óbvio e que está bem evidente e mainstream ultimamente é o Fate. Os personagens possuem Aspectos, que são adjetivos, relacionamentos, objetos ou crenças, e que podem ser usados para dar bônus em uma jogada de dados relevante. Para usar este bônus, o jogador precisa gastar um ponto de destino, que ele consegue utilizando seus aspectos para atrapalhar e complicar a vida do personagem, criando um ciclo bem interessante e que já comentei na resenha do Espírito do Século.
O Fate é um ótimo exemplo pois recentemente li os dois primeiros romances do Dresden Files, e se tem um personagem que falha em praticamente todos os testes é o Harry Dresden. O livro é uma série de complicações e planos que dão errado que vão criando uma espiral emocionante, até que no final obviamente Harry Dresden supera o vilão e se salva no último momento.
Outro sistema que funciona dessa forma bem explícita, com os jogadores procurando o fracasso dos personagens, é o Mouse Guard RPG. Apenas se prejudicando e dando penalidade nas jogadas de dados é que os jogadores irão obter os checks, que irão dar mais ações para eles mais para frente no jogo. Além disso, para aumentar seu nível nos atributos e perícias, você precisa falhar em alguns testes – se a única coisa que você teve foi sucesso, seu personagem não irá aprender.
Espero que tenham aproveitado esta trilogia sobre o fracasso, e espero que tenha ajudado os seus jogos a serem mais proveitosos. Até a próxima!
Caramba! Curti demais essa série!Vou destacar esse novo ponto de vista quando eu for ensinar alguém a jogar RPG.É muito bom ver a Forja a todo vapor desdo início do ano!
Bom é ver os nossos amigos comentando 🙂