Nos últimos anos tenho experimentado diversos jogos de RPG e um deles, já muito comentado por aqui, é o Lamentations of the Flame Princess, um retroclone do D&D que mistura elementos Lovecraftianos transformando-o em algo único, principalmente no que diz respeito ao seu tom muito mais sombrio.

Um dos itens mais úteis da caixa que compõe o pacote do LotFP é Tutorial Book, um livro que pode ser considerado não essencial para muitos mestres, mas que contém uma série de dicas valiosas, que a meu ver, deveria ser parte integrante de todos os livros de RPG, um diferencial em relação a alguns produtos mais antigos, que se apresentam apenas como manuais de regras, sem preocupar-se em ensinar o jogo.

LotFP - Tutorial

O Tutorial ensina o que é RPG

James Edward Haggi IV, autor do LotFP, inicia o livro explicando o que é RPG e o faz de forma direta e bem humorada, embora utilize-se de um conceito que jogadores mais conservadores considerariam heréticas.

Existe um mundo imaginário e você representará um personagem neste mundo. Coisas acontecem, você se encontra em algum tipo de situação e tem decisões a tomar. O que você faz?

Suas ações tem consequências, que podem ser boas, más ou as duas coisas ao mesmo tempo. Isso é RPG: você fingindo ser este cara e coisas acontecendo a este cara.

Não existe forma mais rápida de explicar o que é um RPG… ou tem?

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Independente do sistema utilizado e da forma como a narrativa é conduzia, sempre teremos personagens sendo interpretados [ou blocos de personagens] que reagem a situações, sejam estas apresentadas pelo mestre [RPGs tradicionais], pelos jogadores [mais comum em jogos como Fiasco] ou por algum outro elemento.

Além disso, RPG é um jogo, então temos vencedores e perdedores. Como o RPG é uma experiência social cooperativa, é frequente que todos ganham ou percam um jogo em particular.

Interessante o autor nos lembrar que o RPG é um jogo e que existem vencedores e perdedores.

Mas espere aí, eu me recordo que as definições que tenho ouvido [lido] sobre RPG é de que ele é um jogo onde não existem vencedores ou perdedores, mas parando para pensar, pode haver um jogo onde não existam perdedores e ganhadores? Só se houver empate, correto?

Outro fator interessante e que me chama muito a atenção, é quando ele diz:

Quando você personifica um personagem, você não sabe se está destinado a realizar grandes feitos ou sofrer uma morte ignóbil e sem sentido.

Muitos mestres e muitos RPGs não caminham por esta vertente. O jogo é sobre os personagens e seus feitos e uma morte sem sentido não cabe em suas histórias, mas quando isso não faz sentido no jogo? É quase como se o LotFP imitasse a vida e isso vai desagradar muitos mestres e grupos de jogadores.

No final, não importa vencer ou perder, o importante é jogar o jogo.

Isso é o que eu considero como o jogar para ver o que acontece. Pode ser que a história não termine da forma como todos desejam, todos os personagens morreram em um famoso TPK, mas aí é preciso avaliar as seguintes perguntas:

O jogo foi interessante? Foi excitante?

Foi como eu disse certa vez para um grupo, ao tentar dizer qual a proposta de Call of Cthulhu: “você começa o jogo sabendo que seus personagens morrerão, você vai jogar para descobrir como isso acontece e isso pode ser muito divertido“.

Jogar pela diversão. Claro. Mas cada mesa de jogo pode ter um conceito diferente sobre diversão e como divertir-se. Para alguns, a vitória é tudo que importa. Uma derrota pode ser motivo para abandonar a mesa e classificar o mestre como “matador de personagens“.

Algumas vezes perder é mais interessante e excitante do que ganhar.

Tem sempre as consequências, tão exploradas em alguns outros RPGs menos tradicionais, como o Apocalipse World e seus hacks, cujo grande divertimento advém das falhas e não necessariamente dos sucessos. São as falhas que fazem o jogo seguir adiante.

E vocês? Acham que livros tutoriais são essenciais para ensinar os jogos? Concordam ou discordam com a definição para o jogo dado pelo James Haggi e/ou minhas colocações? Fique a vontade para comentar, concordar, discordar, apresentar os seus argumentos nos comentários ou no Fórum ForjaRPG, onde podemos aprofundar a discussão.

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Escrito por Franciolli Araújo
Esposo de Paula, pai de Pedro e Nathanael. Professor e pesquisador na área de mineração. Um sujeito indeterminado que gosta de contar histórias e escrever sobre elas e acredita que o RPG é o hobbie perfeito, embora existam controvérsias.