Olá leitores e leitoras do ForjaRPG!
Este artigo é uma contraposição ao texto “Por que NÃO ler sobre regras e design“, escrito pela minha digníssima esposa. Eu entendo perfeitamente que ela prefira não conhecer por trás dos panos, mas existem excelentes motivos para ler novos sistemas, conhecer novas regras e quem sabe até arriscar um pouco no design.
Primeiramente, alguém precisa fazê-lo, não é mesmo? Não fosse o trabalho dos game designers, nós não teríamos jogos, em primeiro lugar. Se não houvesse quem apreciasse a beleza de ler, testar e desenvolver sistemas complexos intrincados, nosso hobby não passaria de um polícia e ladrão glorificado. Não importa se você é um admirador do pioneiro Gary Gygax ou do visionário Jason Morningstar, suas partidas de RPG só são possíveis graças a eles.
Não apenas o game designer precisa se preocupar com regras, mas pelo menos uma pessoa por grupo também precisa abraçar esta atividade. Muitas vezes chamado de coitado, de “pobre Mestre”, muitas pessoas realmente prefeririam estar do outro lado do escudo. Mas as que gostam, as que abraçam e se divertem interpretando dezenas de personagens ao mesmo tempo, cuidando das regras, muitas vezes também sendo o líder, motivador e ainda anfitrião do grupo, com certeza facilitam e potencializam a diversão de todo mundo. Não importa se o mestre se encare como um contador de histórias, divertindo o grupo com suas técnicas narrativas; ou se prefere ser o baixista de uma banda, dando o ritmo mas deixando a melodia para os jogadores: na maior parte dos RPGs ele é imprescindível.
E as coitadas das regras? Muitas vezes citadas como “inimigas do roleplay“, eu me pergunto se não participo de outro tipo de hobby que a maior parte dos RPGistas diz jogar. São as regras que colocam limites e ajudam a guiar nossa imaginação, e isso não é ruim de nenhuma forma. Minha opinião é que a criatividade funciona melhor com limites, onde somos forçados a improvisar e a alcançar o desconhecido e o fantástico. Boas regras surpreendem o grupo com conclusões interessantes nos momentos incertos, guiam e focam o grupo para a diversão. As regras não são o jogo, mas o RPG é um jogo por causa de suas regras. Acho uma enorme injustiça culpar as regras por jogadores imaturos que discutem quando não tem espaço para isso, que interrompem a diversão dos outros por detalhes e quebram o frágil contrato social que nosso jogo tanto se apoia.
Ler livros e sistemas diferentes do que se está acostumado expande os horizontes, ensina novas maneiras de se divertir, de encarar o jogo, dão um novo ar e levam a lugares inexplorados da imaginação. Não apenas as regras, mas também os ricos cenários e personagens, tão interessantes, cativantes e fantásticos.
E tem ainda o lado que o Henrique deixou nos comentários: há malucos que acham isso divertido! Que gostam de conhecer regras novas, de fuçar em sistemas, de invendar maluquices e transformar isso em jogo. É quase um hobby a parte, mas que muita gente ignora que pode muito bem ser divertido por si só.
Como eu disse antes, eu entendo quem prefere não conhecer os bastidores e saber como a matrix funciona. Existe a idéia de que o TV Tropes irá estragar sua vida, arruinando para sempre a maneira que você enxerga filmes e mídias, e talvez para algumas pessoas a mesma coisa se aplica a teoria e design de RPG. Mas para outras, mais conhecimento é sempre bem vindo. Viva a diversidade!
Por que afinal, todo o ponto da história era ir para Mordor. E alguém precisou fazê-lo!
Eis que a Forja me surpreende com uma dialética sobre o RPG: Mari nos brinda com a Tese, Pedro com a Antítese…Me sinto obrigado a formular uma síntese… XDEnfim, excelente texto – um ponto de vista bastante complementar ao artigo anterior, no meu ponto de vista.
Excelente artigo Pedro.Como você e a Mari bem disseram, “Viva a Diversidade”.Há quem gosta de ler, a quem não gosta de ler e há espaço na minha mesa para ambos 🙂
[…] lado, a Tese acerca do feeling de ser o jogador e resolver os desafios no jogo; do outro, a visão “behind the scenes“ do jogo, a compreensão sobre a mecânica e suas […]
Cara!!! Esse texto… Esse texto… Há tanta verdade nele. Inclusive, na parte em que você fala que a criatividade funciona melhor com limites, lembrei muito de Isaac Asimov, que criou as Leis da Robótica e escreveu histórias memoráveis circundando estas Leis.
Confissão: eu uso o TV Tropes pra validar idéia de plots em jogos simulacionistas/gamistas.
Pedro, eu concordo completamente com você.Completaria dizendo que tem jogos que em que todos os jogadores (pelo bem da história) precisam entender as regras. Claro que entender as regras e ler o livro são coisas distintas. Eu gosto de ler os livros e sempre que posso assim o faço – estou jogando o Um Anel e aprendi as regras com o mestre, mal folheiei o livro. Porém, o pouco que li me encantou e eu lerei o restante sem problema algum – o livro me passa tão bem o clima do jogo. E mais não posso depender apenas da interpretação que o mestre fez dos textos – o jogo não é só dele, o clima, a impressão pessoal de todos devem permear o jogo. Acho que deve ser por isso que prefiro jogos em que a criação da ambientação é partilhada pelos jogadores… Gosto disso tanto como narrador como jogador.
A galera ainda não entendeu que não é que eu não goste de regras – eu as adoro! Só não gosto de ler sobre elas. Acho-as imensuravelmente necessárias para o desenrolar do jogo…
Pois é, pra ter pessoas como você (e minha esposa, e o outro jogador que não ficam atrás de regras o tempo todo) precisam haver pessoas quem gostam de ler sobre as regras, pra dar esse suporte. E isso faz com que você não precise se preocupar em fazer algo que não gosta (ir atrás de fuçar a engenharia do jogo), aprendendo elas de forma intuitiva e gradual, supernormal.Eu vejo a coisa como um jogo de videogame: a pessoa não precisa ter conhecimento do dano por segundo, cada funcionamento de cada poder ou quanto é o life dos chefões, pode simplesmente ir apertando os botões e procurando outras coisas no jogo (história, pancadaria, etc.). Mas alguém se preocupou em desenhar o funcionamento das regras do jogo (por mais que ela não vá atrás de vê-lo), e mais: a pessoa que não se importa em ir atrás das regras, geralmente acha o jogo ruim quando a jogabilidade é uma porcaria (ou seja, o design é malfeito). Muitos continuam jogando por “amor à camisa” (eu e The Witcher ou Skyrim, por exemplo), mas sabem que não gostam da jogabilidade.Enfim, que o pessoal entendeu assim porque há esse velho costume de rivalizar regras e roleplay, como se uma coisa não interferisse na outra.
Caraca, toda vez que eu vejo alguém contar vantagem que “tal sessão foi quase toda só na interpretação, sem rolar um dado sequer”, me dá um nervoso. hahaha
Daniel, tua definição foi PERFEITA! Queria ter pensado nela para ter escrito no texto, realmente excelente.
Quando alguém me fala isso, na hora me vem na cabeça “putz, ainda bem que eu não estava nessa sessão”. O que é bem curioso, pois eu mesmo costumava pensar dessa forma alguns anos atras, que sessão de “puro roleplay” era o supra-sumo do RPG.Acho que isso vem mesmo de achar regras que você se identifica e gosta. Aí você quer interagir com elas, para ver coisas legais acontecendo no jogo. Talvez esse seja o ponto: para muita gente, o RPG deve ser legal apesar das regras, e não por ajuda delas.
É Pedro, tu és o Richard Dawkins do RPG nacional mesmo. HeheheMas nesse texto eu vi o Carl Sagan do RPG, mostrando como a magia do conhecimento é essencial para melhorarmos.O sentimento que eu tinha quando era surpreendido por algum elemento do jogo, tal como a Mari explicou, sofreu uma evolução (no sentido carnavalesco da palavra, quando denota modificação, se tornar algo diferente). Você mais do que ninguém sabe o quanto fico pasmo com as novas mecânicas dos RPGs, pirando ao ler um ótimo conjunto de regras que me fazem pensar o porquê ninguém pensou naquilo antes. Esse é o novo tipo de surpresa que tenho com o RPG.Realmente adorei o post da Mari. Penso que todo designer de RPG deveria lê-lo, pois isso o levará a pensar em como agradar aqueles que não tem muito saco de se debruçar sobre os livros de regras. Fica a dica para quem curte criar jogos!Agradeço a você e a Mari por expandirem as dimensões que o assunto ‘RPG’ pode ser encarado. O mesmo hobby, várias dimensões! Massa!
Delibriand, toda vez que alguém fala esse tipo de coisa (“no meu jogo não tem rolagem de dados, só roleplay”), Deus vicia um D20 pra só tirar 1. Francamente, colocar a sua opção como se fosse a melhor, a maior, a primeira e a única… ops! Citação falha…
Pois é, eu aprendi muito disso procurando o sistema certo pra jogar no meu estilo. Antes eu até achava que regras atrapalhavam, mas hoje acho que as regras atrapalham quando não servem ao que se propõem (ou quando você está usando lápis de cera pra encaixar parafusos)