Eu recentemente desenvolvi aversão a GM Fiat e a alterar o resultado dos dados durante o jogo. GM Fiat, ao contrário do que já me sugeriram no twitter (hahha) não é uma fusão entre duas montadoras de carros. Fiat, em inglês, significa “ordem ou decreto arbitrário”.

Acredito que essa discussão também cabe criticar o que é a Regra Número Zero do RPG. Normalmente ela é algo do tipo:

Se as regras atrapalharem a história que você está criando, ignore as regras!

Parece um motivo nobre e justo. E seria, se acontecesse algo assim no jogo: Após um resultado inesperado nos dados, algo que seria frustrante ou anti-climático no jogo aconteceria. O mestre decide então expor os fatos para os jogadores e, após um consenso com todos, é decidido que essa regra será ignorada agora por não fazer muito sentido.

Você já viu isso acontecendo na mesa? Eu pessoalmente devo ter presenciado isso uma ou duas vezes. Normalmente essa autoridade está completamente nas mãos do GM, e é daí que vem o GM-Fiat que considero negativo.

No meu post recente sobre Regras e Alterar dados, eu disse o seguinte:

Se você está alterando o resultado dos dados, o seu sistema de jogo está falhando com você.

Acho que está muito claro que se você está utilizando um sistema que os dados estão dando resultados anti-climáticos para o seu jogo, você está o tempo todo lutando contra o sistema e muito provavelmente teria uma experiência muito melhor procurando outro conjunto de regras que não causasse isso.

O que aconteceu no meu jogo foi uma situação onde uma regra do jogo podia ter criado consequências indesejadas na narrativa, e que eu considerei ignorar “para o bem da história”. A conclusão foi que eu engoli seco e usei a regra, torcendo para que o resultado fosse bacana. No final, deu tudo certo. Mas e se não desse?

Eu teria então duas opções. Eu poderia usar a regra número zero da forma que ela é proposta: eu iria discutir com os jogadores o resultado das regras, se valia a pena alterar para o bem do jogo, e chegaríamos a uma conclusão juntos. E eu não vejo o menor problema com essa abordagem. Ou eu poderia ignorar os dados, escolher o resultado e “fingir” que os dados saíram daquele jeito. Isso funcionaria para manter a história, mas não ajudaria em nada nas próximas vezes que isso fosse acontecer, além de criar uma dicotomia artificial nas regras que os jogadores acreditam estar jogando e nas regras que eles estão de fato jogando, que eu considero negativa.

Porém, eu não vejo nenhum problema em não conhecer completamente as regras e improvisar. Em alguns momentos o ritmo do jogo é mais importante do que jogar do jeito que está escrito nas regras. Mas nesse caso você deve ou jogar com a regra alterada para o resto da camanha, ou informar aos jogadores qual seria a regra correta, o motivo que levou você a usar a regra errada, e falar que a partir de agora ela será usada como está escrito no livro.

Mas no comentário do meu post anterior, que publiquei no Paragons, eu tive os seguintes comentários:

De fato eu já alterei e muito os resultados dos dados, tudo para o bom andamento da historia. Eu dou preferência a historia, e esqueço um pouco o sistema, mas chega um momento onde ele se torna inevitável. E pode acabar estragando toda uma narrativa.

O mestre deve sim ignorar regras quando elas entram em conflito com a história. Aliais, ele não deve, ele tem que possuir essa capacidade.

Acho que o mestre deve ignorar as regras sim, se ele quizer privilegiar a história (seria estória… no novo acordo?), se não quizer pode deixar os dados selvagens dominarem!

Eu particularmente altero de vez em quando algumas rolagens em benefício da história (mas não a minha – não tenho preciosismo -, e sim a que eu e os jogadores queremos e estamos empolgados criando). Se quando eu faço isso o sistema não está sendo bom pra mim, então nenhum sistema é, porque até nos sistemas considerados melhores eu faço isso.

O problema de todos os relatos acima, é que a história que eles estão defendendo a unhas e dentes significa na verdade “a história planejada pelo mestre”. Você quer uma prova? Pense o seguinte: Se é justo o mestre alterar os dados e as regras unilateralmente para o bem da história e se isso justifica enganar os jogadores, por que eles não tem o mesmo direito do outro lado? Por que é considerado trapacear se um jogador rerola um dado que tirou uma falha crítica mas ele realmente realmente queria passar no teste? Por que o jogador não é permitido ter seu próprio escudo, rolar os dados escondido atrás dele, e só falar para o mestre se ele passou ou não nos testes? Parece absurda essa idéia pra você?

Se os jogadores da campanha que você está mestrando gostam de ter uma “história do mestre” e estão apenas explorando o que você já criou, não tem o menor problema. Mas nos meus jogos, eu gosto de dar realmente o poder de alterar a narrativa para os jogadores – e eu gosto de ter este poder quando estou jogando. Pra mim, essa é a graça de jogar RPG, e fico realmente frustrado quando isso é tirado de mim, ainda mais utilizando mentiras e quebrando a confiança no jogo.

Uma enorme falácia foi criada no início do nosso hobby. A falácia é de que “os jogadores tem controle completo sobre seus personagens” ao mesmo tempo que “o mestre tem controle completo sobre a história“. Isso é impossível: se os jogadores tem controle completo sobre seus personagens, eles tem poder de alterar a história. Por outro lado, para o mestre possuir controle completo da história, ele precisa diminuir a influência dos personagens para conseguir isso. O grande “X” da questão é que pra mim, faz muito mais sentido (além de ser mais divertido) abdicar da parte “o mestre tem controle completo da história”.

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Escrito por Pedro Leone
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