Saudações, aventureiros.

Neste artigo concluímos a tradução dos artigos produzidos por Ben Robbins e publicados no site Ars Ludi. O artigo foi publicado em 29 de junho de 2018.

Só para lembrar, a série de artigos é dividia em sete partes, que vocês podem acessar nos links abaixo:

  1. Marcha para o Oeste
  2. Marcha para o Oeste: Compartilhando Informações
  3. Marcha para o Oeste: Reciclando
  4. Marcha para o Oeste: Morte e Perigos
  5. Marcha para o Oeste: Mestrando sua Própria Campanha
  6. Marcha para o Oeste: Segredos e Respostas
  7. Marcha para o Oeste: Camadas de História

“Faça a simulação em sua cabeça: quem se moveu para cá, o que eles fizeram, o que aconteceu com eles, e o que virá a seguir?”

A lógica é o alicerce de uma aventura aberta. Se as coisas fazem sentido – se existe uma consistência interna entre o que está lá e onde as coisas estão – então os jogadores poderão tomar boas decisões. Prestar atenção leva a boas escolhas, e boas escolhas levam ao sucesso. Personagens inteligentes sobrevivem e prosperam.

Sem isso, o ambiente se torna um jogo de adivinha sobre o que o Mestre decide colocar em cada esquina. Não existe uma maneira de tomar decisões inteligentes. Nem é divertido e nem é justo.

Então, como você faz um mundo ter sentido? Você constrói a história, porque o passado determina o presente. Sim, é nesse ponto onde Microscope e Marcha para o Oeste se conectam.

Muito antes de eu pensar Microscope, quando eu criava mundos de D&D, eu imaginava camadas de histórias uma em cima das outras, pulando para frente e para trás em minha cabeça, imaginando o que teria acontecido para que as coisas estivessem como estão. Ou vice-versa: alguma coisa que você cria no presente e faz você pensar “de onde isso veio”, então você cava um pouco na história para estabelecer suas origens.

Então, quando eu me sentei para criar uma pequena região nos ermos, eu a nomeei “West Marches” devido a uma antiga aventura old school, então eu terminei de desenhar algumas masmorras e escolhi algumas criaturas a partir do antigo Manual dos Monstros? Não, primeiro eu pensei sobre o que estava ali antes. Nada incrivelmente detalhado, apenas um conceito inicial para o mundo e o esqueleto da história.

Camadas de História

O esqueleto de uma história é seu amigo. Mesmo o mais simples esboço lhe dirá o que pertence ou não ao mundo, e isso é uma vantagem bem vinda quando você quer semear sua região com alguns perigos e pontos de interesse. Esses são dois benefícios, se você estiver acompanhando: isso não somente torna o jogo melhor, também fica mais fácil povoar o sue mundo.

Comece com três ou quatro camadas independentes de história. Apenas um conceito simples, nada muito detalhado. Essa é a história local da região, mas ela deve refletir eventos globais maiores. Ou não. Para a campanha Marcha para o Oeste, minhas camadas são essas:


a) O Duque expulsou os goblins, os assentamentos avançam para as regiões selvagens e então falham;

b) Anões exilados migram para a região e constroem colônias longe de casa;

c) A idade das trevas dos “homens das colinas” espalharam os senhores feudais, clãs e reis-guerreiros primitivos;

d) Remanescentes das guerras dos deuses, fim da era sagrada, deuses esquecidos.


Esta é a ordem cronológica descendente, com os eventos mais recentes (e portanto mais visíveis e conhecidos) no topo, pois fazem mais sentido para mim. Mais embaixo estão coisas enterradas no passado, formando mitos e lendas. As ruínas desses tempos antigos são as mais desgastadas e destruídas, enquanto as remanescentes do topo da lista são as mais recentes e bem conservadas.

Cada camada é completamente independente e distante uma da outra. Os reis dos Homens das Colinas estavam amontoando ossos em seus túmulos quando os anões proscritos do Rio Negro vieram à procura de montanhas para escavar um novo lar. Mais importante (para os meus planos para a Marcha para o Oeste), cada uma dessas camadas de história deixam suas pegadas, mas muito delas também foram apagadas, deixando a região reverter quase inteiramente para uma região selvagem quando outro período começou.

Mais coisas acontecem entre essas camadas, mas estes são os grandes marcos, as fases chave do passado que moldaram esta região.

Armado com apenas estas ideias simples, eu posso me inspirar sobre o que colocar no mapa e eu sei porque as coisas são do jeito que são. Agora, quando estou desenvolvendo os “Carvalhos Apodrecidos” e eu sinto que uma área vazia precisa de algum tipo de ponto de referência interessante, eu posso dizer para mim mesmo: “os colonos não teriam ido tão longe do Vale Minol, mas os anões poderiam ter chegado lá quando construíram seu segundo salão nas Colinas Solitárias, então um marcador de pedra anão ou uma tumba isolada de alguém que morreu no caminho faria sentido.” Pronto, problema resolvido.

Eu posso até mesmo ter várias camadas de história construídas uma sobre a outra no mesmo local. Eu sei que existem goblins na Floresta da Aurora porque eles são os remanescentes dos que foram expulsos pelo exército do Duque décadas atrás. Os reis dos Homens das Colinas estiveram aqui antes, então o covil dos goblins pode ser uma antiga fortaleza em ruínas que eles encontraram e infestaram. Mas nas cavernas que ficam abaixo, estão as cavernas sagradas, que os reis-guerreiros temiam e consideravam sagradas, remanescentes dos deuses cujos nomes os homens esqueceram. Agora, tenho uma masmorra com três camadas distintas de material para trabalhar. Sim, estes são exemplos bem literais de camadas, mas você deve ter entendido a ideia.

A ação em cada camada da história não precisa ser espalhada uniformemente pelo mapa. Alguns eventos podem abarcar toda uma região, mas outros podem afetar apenas algumas áreas enquanto o resto permanece intacto. Os anões colonizaram algumas áreas importantes e se aprofundaram lá, mas na maior parte da região não possui ruínas de construções dos anões, embora eu ainda possa colocar um tesouro e relíquias dos anões que pode ser encontrado nas proximidades (você leu Tesouros Contam uma História, certo?).

E assim como Microscope, sua história não irá emergir toda de uma vez. Você pode começar com um simples esqueleto (e como eu disse, você deve realmente começar com algo mais simples), mas a medida que você vai jogando, você pode imaginar mais detalhes e nuances, que informarão o que deve existir no mundo e por que. Você pode até mesmo pensar em novas camadas que deseja adicionar, ou talvez você apenas explore o que estabeleceu mais e mais.

Mestre: Guardião dos Segredos

Parte de minha antiga filosofia de D&D era que, por definição, o Mestre sabe mais do que os jogadores. Você cria um monte de coisas, mas ao invés de contar aos jogadores, você as esconde. Você não os ensina sobre o mundo: eles exploram e descobrem as coisas. Ou não.

Em muitas de minhas campanhas, eu mantive grandes segredos por anos e anos. Quando os jogadores descobriam, suas mentes eram iluminadas.

Mesmo que o histórico que eu planejei nunca fosse revelado, isso mudou a minha atitude como Mestre. As coisas no “presente” pareciam mais reais, e menos do que coisas que eu simplesmente fiz, porque eram conseqüências da história oculta. Isso também mudou os meus maneirismos em jogo. Eu sabia que os jogadores estavam observando eram apenas pedaços de um quebra-cabeças maior, então eu passei a tratar o cenário com seriedade e respeito.

Eu não creio que este seja o único caminho para o Mestre, mas para a campanha Marcha para o Oeste, onde você quer que os jogadores pensem e deduzam, ele se encaixa perfeitamente. Se é difícil descobrir segredos, quando os jogadores descobrem, é uma vitória. Eles podem ficar orgulhosos de seu sucesso, da mesma forma que ganhar uma luta (por exemplo, finalmente descobrir o estúdio do Abade depois de meia dúzia de outros aventureiros terem falhado).

Então, sobre todas essas camadas de histórias que você criou: “não conte aos jogadores sobre elas”. Nem deseje que eles descubram. Essa é uma atitude muito apropriada para Mestres de Marcha para o Oeste, onde como Mestre você não deve querer nada. Deixe que eles explorem, experimentem e tirem suas conclusões, se eles se interessarem. Se não, tudo bem também, porque não é para isso que eles estão lá. O mundo ainda será um lugar melhor e mais consistente para eles tentarem a sorte e desafiarem o desconhecido por causa da história omitida.

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Escrito por Franciolli Araújo
Esposo de Paula, pai de Pedro e Nathanael. Professor e pesquisador na área de mineração. Um sujeito indeterminado que gosta de contar histórias e escrever sobre elas e acredita que o RPG é o hobbie perfeito, embora existam controvérsias.