Neste semestre estou lecionando a disciplina Metodologia Científica para alunos do 1º ano do Curso Técnico de Redes de Computadores e no último sábado (12.05.18), tivemos uma aula presencial – algumas delas são ministradas à distância – e pensei em levar alguma coisa diferente para a sala de aula, afinal, os estudantes estão inseridos no modo integral, com aulas nos turnos matutino e vespertino, e após uma semana intensa de aulas, acabei dando um refresco para eles e gostando muito da experiência.

Para tornar o sábado mais animado, pedi que eles trouxessem jogos analógicos, mas acabai pensando que uma atividade orientada seria mais proveitosa e então saí em busca de algo que eu pudesse utilizar em minha prática pedagógica – eu não costumo usar esse vocabulário pedagógico no meu dia a dia – principalmente porque os jogos que eles poderiam trazer estaria limitado a um pequeno número de pessoas e consumir um tempo excessivo, sendo que a princípio eu estava limitado a uma experiência de 1h40min.

Pouco antes das 7h30min entrei em sala e coloquei no quadro:

  • Introdução
  • Materiais e Métodos
  • Resultados e Discussão
  • Conclusão

A medida que os estudantes iam entrando, perguntavam se aquilo era uma atividade e então fui distribuindo tarefas:

Gabriel, pegue duas folhas de papel e recorte na forma de pequenos quadrados, enquanto você, Leonardo, vai escrever a letra D em um quadrado, a letra V em um quadrado, a letra L em três quadrados e a letra A em 25 quadrados. A medida que as letras forem escritas, a Vitória dobrará os quadrados, de forma que as letras não fiquem visíveis.

A essa altura já era clara a excitação do grupo. Alguma coisa ia acontecer, mas eles não sabiam ainda o que era.

Com todos os quadrados preenchidos e dobrados, agora prestem atenção no leiaute da sala e façam um círculo com as cadeiras. Quando terminarmos a atividade, as cadeiras voltam para o mesmo lugar.

Parecia que a atenção deles já havia sido capturada e quando estavam todos dispostos em um círculo – ou algo parecido com isso – comecei a distribuir os quadradinhos de papel dobrados, um a um e disse:

Vocês são aldeões, morando em um vilarejo que está sendo assolado por uma praga de lobisomens e cabe a vocês protegerem a vila antes que todos tenham perecido diante da fome dessas terríveis bestas.

O jogo que escolhi para a brincadeira foi o Werewolf (lobisomem), um party game ou game festivo que comporta um grande número de jogadores.

Embora eu não tenha pesquisado a fundo, a primeira versão do jogo parece ser de 1986, criado pelos designers  Dimitry DavidoffAndrew Plotkin. O jogo original também tinha uma previsão média de 60 minutos, podendo ser jogado até por 24 pessoas, embora eu acredite que isso era uma limitação do número de cartas.

A versão que apresentei aos estudantes pode ser baixada no site da Ludopedia neste link aqui (requer cadastro). Particularmente, recomendo que faça o seu cadastro na Ludopedia, ele é um excelente local para conseguir informações sobre jogos de tabuleiro modernos e encontrar gente bacana que também aprecia o hobbie.

Jogando o jogo

Os aldeões de uma vila (a maioria das jogadores) tentam proteger-se dos ataques de lobisomens (apenas alguns jogadores) e devem fazê-lo intercalando turnos, denominados Dia e Noite, normalmente sob a coordenação de um moderador.

Dois dos aldeões possuem poderes especiais, sendo eles o Médico (pode salvar/imunizar alguém) e o Vidente (pode tentar descobrir quem são os lobisomens).

Turno da Noite

No turno da noite, todos os jogadores devem fechar seus olhos e em bater na mesa, no chão, aonde estiverem jogando, para criar um barulho e impedir que qualquer pista sobre quem é quem possa ser passada. O moderador então pede que os lobisomens e somente eles abram os olhos e em seguida indiquem alguém que deve morrer. Tem que haver consenso.

Em seguida, os lobisomens fecham os olhos e o médico é despertado, indicando alguém que ele queira salvar (ele incluso) e então fecha os olhos para que desperte o vidente, que apontará para uma pessoa que ele acha que é o lobisomem e o moderador deve confirmar ou não.

Turno da Manhã

Caso o médico tenha salvo a vítima dos lobisomens, nenhuma morte acontece, mas todos sabem que alguém foi salvo, caso contrário, o jogador, cujo personagem foi morto pelos lobisomens sai do jogo, mas não revela quem ele era.

Os aldeões reúnem-se então na vila e instauram um tribunal, onde escolherão algum dos jogadores para ser linchado e aqui o jogo fica muito interessante, pois os jogadores podem dizer qualquer coisa para permanecerem vivos, mas algum dos personagens, por votação, deverá ser executado e o jogador sairá do jogo, mas não revela qual papel desempenhava.

Após isso, o turno da noite se inicia novamente e o jogo segue até que duas condições sejam cumpridas:

a) O número de aldeões vivos se iguale ao número de lobisomens vivos: vitória dos lobisomens;

b) Todos os lobisomens sejam mortos: vitória dos aldeões.

Em sala de aula

A experiência foi muito positiva e após terminarmos a primeira partida, os alunos me informaram que eu era o único docente com o qual teriam aula e pediram para jogarmos mais uma vez.

Jogamos mais uma vez e ao final, eles tiveram que realizar a tarefa, fazendo um pequeno texto com os elementos básicos de um artigo científico, com:

  1. Introdução: Contextualização do jogo;
  2. Materiais e Métodos: O que foi necessário para jogar e quais as regras;
  3. Resultados e Discussão: Detalhar como foi a experiência do estudante com o jogo;
  4. Conclusão: A partir das experiências do jogo, cada estudante escreveria algo que ele considerasse como uma conclusão para o trabalho.

A partir dos textos, serão identificados elementos característicos dos artigos científicos, de forma a melhorar e ampliar as experiências dos estudantes a partir da contextualização de suas experiências com o jogo.

Nas duas partidas que jogamos, os aldeões conseguiram vencer os lobisomens, da segunda vez com um pouco mais de facilidade, tendo perdido apenas seis aldeões.

As minhas considerações

A experiência foi muito gratificante. Primeiro por criar uma mobilização de toda a turma para a realização da tarefa, e segundo por ter conseguido inserir um elemento lúdico em uma atividade que muitas vezes se restringe a atividades enfadonhas na sala de aula.

Por outro lado, algo muito gratificante, foi poder apresentar algo diferente para os alunos, que gostaram da experiência e por isso repetiremos mais algumas vezes ao longo do ano.

E você?

Como professor ou aluno, já teve uma experiência com jogos em sala de aula? Deixe seu comentário aqui em baixo.

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Escrito por Franciolli Araújo
Esposo de Paula, pai de Pedro e Nathanael. Professor e pesquisador na área de mineração. Um sujeito indeterminado que gosta de contar histórias e escrever sobre elas e acredita que o RPG é o hobbie perfeito, embora existam controvérsias.