No artigo anterior falei sobre como criar aventuras com pouco trabalho… do mestre e neste artigo vou falar sobre como um simples mapa rendeu uma grande aventura.

Não havia sido uma semana fácil e os jogadores estavam me cobrando uma aventura que lhes havia prometido. Dez minutos antes de sair para o local do jogo rabisquei um mapa, indicando a vila onde os jogadores estavam e alguns pontos e acabei chegando somente com isso na sessão de jogo.

A mapa

Enquanto os jogadores não chegavam, fiquei pensando no que eu iria fazer e parece que as ideias iam e vinham, como na tela branca do computador, que você digita, reflete um pouco e não consegue ir adiante, apagando aquilo que escreveu.

Já passei por isso na época das máquinas de escrever e quanto papel não gastei dessa forma! Eu sei, havia uma forma mais inteligente de fazer isso, mas…

Os jogadores foram chegando e eu sentia o pânico se apoderando de mim. Eu não queria, naquele dia especificamente, propor uma outra atividade para os jogadores. Eu também queria jogar, mas não havia nada pronto. A não ser um mapa com alguns pontos desenhados.

Quando todos sentaram-se ao redor da mesa, olhei para o rosto de cada um dos presentes e então disse:

[blogoma_blockquote]Na feira, enquanto pechinchavam os preços de equipamentos e tentavam vender os objetos obtidos em sua última jornada, encontram um homem velho e sujo, que se aproxima de vocês com uma caixa. Ele estende-a para vocês e a oferece por 10 shilings de prata, dizendo que guardara a caixa por muitos anos, mas que a fome o obrigava a livrar-se dela. – É uma caixa dos segredos. Disse o homem, que completou antes que alguém pudesse falar alguma coisa: – mas nunca consegui descobrir que segredo é esse.[/blogoma_blockquote]

O homem poderia estar dizendo a verdade… ou não. A caixa com certeza não vale tanto. O que vocês fazem?

Como o grupo havia vendido alguns itens na sessão anterior, resolveram ficar com a caixa, pagando até mais do que isso.

[blogoma_blockquote]Bethani, a maga do grupo, motivada pela curiosidade, retirou algumas moedas de sua algibeira e entregou ao homem, dizendo-lhe que havia ali um pouco mais do que ele pedira pela caixa e o suficiente para ele aplacar a fome por vários dias, se assim desejasse. O velho olhou nos olhos da jovem maga e com lágrimas escorrendo disse-lhe: – É possível que a caixa a tenha escolhido minha senhora. Se assim for, pela sua generosidade, o que ele poderá lhe revelar? O homem saiu, mas não antes de colocar as moedas em uma algibeira bolorenta.

– Quanto lhe deu? Perguntou Anton, um dos guerreiros do grupo.
– Dez coroas de ouro. Respondeu a maga.[/blogoma_blockquote]

A ideia da caixa os havia fisgado e eles compraram a ideia, sendo, inclusive, bem mais generosos do que eu havia imaginado a princípio.

A região que seria explorada

Quando retornaram aos seus quartos na estalagem, a jogadora interpretando Bethani, informou que analisaria os padrões para descobrir uma forma de abrir a caixa. Ela balançara a caixa, mas não percebeu nenhum movimento, o que poderia significar que a não havia realmente nada dentro da caixa.

Com um valor alto em Inteligência e Sabedoria, a personagem consegue passar em alguns testes e desvendar o padrão, abrindo a caixa e descobrindo dentro dela um mapa de pano. O mapa possuía uma marcação com o um nome, a capital do reino. Algumas linhas rabiscadas, que a ranger disse tratar-se dos rios que cortavam o reino e alguns outros pontos que não conseguiram identificar, sendo que um deles chamou a atenção. Não era um X, mas tão somente um pequeno quadrado dentro do que parecia ser uma pirâmide.

A partir daquele momento, fiquei prestando atenção à especulação de todos ali presentes. Eles analisavam o mapa e começavam a conjeturar o que poderia ser encontrado naqueles pontos, como eles poderiam acessá-los e que preparativos deveriam fazer. Imaginavam que a pirâmide poderia realmente ser uma pirâmide e que a figura nele inscrita poderia ser a representação de um sarcófago.

Sobre outros pontos falavam sobre menires, locais de poder, linhas de Ley e tantas outras coisas esdrúxulas. Fui anotando tudo. Qualquer coisa que eles falavam era prontamente anotada e considerada. Imaginei os perigos que poderiam surgir, os monstros que eu poderia adicionar para transformar a viagem em algo mais… interessante.

Quando eles tiveram dúvidas sobre algumas localizações, perguntaram se havia alguém na cidade que pudesse ajudá-los com informações sobre a região. A cidade era grande e havia um cartógrafo na área, ao que prontamente foram até ele e o contrataram como um especialista. Sua missão era fornecer um mapa representativo da região e tentar determinar as localizações.

O tempo passou rápido. Foram quase duas horas com os jogadores conversando entre si e interagindo com alguns NPCs para auxiliá-los com o mapa, que foi ganhando mais detalhes (montanhas, lagos, vilas, pontos de referência) e um grupo ávido por explorar o desconhecido.

Também procuraram o homem que vendeu a caixa à maga, na esperança de conseguir mais informações, mas nesse momento os dados não ajudaram e eles não conseguiram pistas do paradeiro do homem, que muitos diziam, nunca terem visto.

Alguns ainda argumentaram que poderia não haver nada. Que o mapa poderia ser uma farsa, uma armadilha ou esconder um grande perigo. Merise, a ladra do grupo, argumentava ainda que um grande tesouro poderia estar escondido naquele local e que eles só precisavam estar preparados.

A curiosidade falou mais alto e na sessão seguinte eles partiram em busca de alguma coisa. Ninguém sabia o que era. Nem mesmo eu como mestre, mas a aventura era deles. Só deles.

Em momento algum eu os induzi com palavras sobre o que fazer ou para onde ir. Corri um risco quando lhes apresentei a caixa e deixei as coisas rolarem, mas eles compraram a ideia, acharam divertido e saíram preenchendo todas as lacunas que o mapa apresentava – nem todas, claro, mas o que eles fizeram enriqueceu a mesa com as propostas deles, que eles mesmos criaram e provavelmente nem se deram conta, nem naquela sessão e nem nas seguintes.

Nesses momentos, percebo que acabo me divertindo mais do que os meus jogadores.

Quando as coisas fluem e os jogadores almejam a criação de uma história na qual eles não são meros coadjuvantes, um simples rabisco em um pedaço de papel, faz aflorar as ideias mais loucas e fantásticas que podemos ver em uma mesa de RPG.

Hoje, eu simplesmente não consigo me ver mais, mestrando em uma mesa aonde os jogadores vão simplesmente respondendo desafios, sem ajudar a criá-los também.

É a criação colaborativa, mais uma vez bato nesta tecla, que faz do jogo algo tão fantástico.

Até a próxima.

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Escrito por Franciolli Araújo
Esposo de Paula, pai de Pedro e Nathanael. Professor e pesquisador na área de mineração. Um sujeito indeterminado que gosta de contar histórias e escrever sobre elas e acredita que o RPG é o hobbie perfeito, embora existam controvérsias.