O excelente texto do FC Pereira aqui no Forja RPG me fez voltar a escrever (e o texto da Morte do RPG não conta). Apesar de ser muito bem escrito e fundamentado, eu discordo do FC em vários pontos.

Ainda nos primórdios do RPG, quando Gary Gygax estava criando as primeiras masmorras no D&D, descobrimos a diversão que era explorar masmorras escuras e descobrir tesouros e enfrentar monstros terríveis. O perigo estava sempre a espreita, o desconhecido era a única constante, e a “história” a ser desenvolvida era mínima. Quando muito, era a história sobre o seu personagem enfrentando perigos em busca por riquezas. Os desafios que ele enfrentava, suas fugas, descanso, interlúdios, altos e baixos, eram o que junto formavam a história.

Avance 40 anos, para um pequeno suplemento de menos de 20 páginas chamado Lady Blackbird. Em um simples e elegante sistema que está resumido em cada ficha de personagem, ele traz para um mestre uma situação inicial carregada de intriga, ambições, movimento, traição, amizade, amor e outras emoções humanas. É impossível prever o que vai acontecer, e mesmo sem conter uma única sugestão do que fazer a partir da cena inicial, cada grupo sabe exatamente onde quer ir, e leva a aventura a lugares inimagináveis pelo designer do sistema/aventura.

Nos dois exemplos dados, tanto no D&D Oldschool como no Lady Blackbird, não houve preparação de três atos como sugerido pelo FC, nem preparação de plot, nem história pré-planejada pelo mestre. O que ocorreu em ambas as situações é o que é chamado de história emergente. Ao invés de ser colocada de fora para dentro do jogo pelo mestre, através das suas técnicas de jogo, ela surge naturalmente, sem pressão, quando e onde ocorrer. Curioso também reparar este ponto de similaridade entre os story games e os RPGs oldschool. Outra maneira bem comum de história emergente é o sandbox, que não é necessariamente igual ao oldschool.

Existem vantagens da história antes, como o Ron Edwards chama a contra-posição da história emergente. Para quem está acostumado, é prazeroso e divertido uma boa história, com um ritmo e clímax no lugar certo ditado pelo mestre, ritmo e clímax este que pode sequer ocorrer na história emergente. Pelo contrário, um TPK ou outro tipo de anti-clímax é possível de acontecer e os jogadores podem se frustrar com este tipo de situação.

Por outro lado, existem prazeres na história emergente que não existem em uma história guiada pelo mestre. Começando principalmente com a história sair das costas do mestre, como já cidado no podcast do Jogador Sonhador, no Botequim dos Jogos. Você ainda precisa fazer preparação: no caso do Oldschool, você precisa preparar masmorras e ganchos; no caso de um story game, você precisa preparar situações, NPCs, motivações,  etc; no entanto, você não precisa mais fazer o ilusionismo (ou railroading) para manter o ritmo da sua história.

E não é só de clímax e ritmo que vem a graça do RPG. Interpretação do seu personagem com outros jogadores e NPCs, ver o desenvolvimento do personagem (tanto numérico quanto em personalidade, ou em relacionamento com outros NPCs), ver aquela rolagem quase impossível dar certo, ver aquele plano impossível dar completamente certo, ver aquele plano besta dar totalmente errado, entre outras infinitas diversões sociais e de jogo que são demais para citar aqui.

Então minha conclusão é: esteja preparado, se é isso que você valoriza. Mas existem outras formas de se divertir, que exigem muito menos ou nenhuma preparação, se é isso que você prefere.

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Escrito por Pedro Leone
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